Reportagem: Supernova 2016 [Campus de Campolide, Lisboa]

Reportagem: Supernova 2016 [Campus de Campolide, Lisboa]

| Setembro 22, 2016 6:30 pm

Reportagem: Supernova 2016 [Campus de Campolide, Lisboa]

| Setembro 22, 2016 6:30 pm

Mais um ano e mais um Festival Nova Música, este ano sob o nome de Supernova graças à vasta oferta de cultural que existia no Campus de Campolide em Lisboa. Chegámos e já fazia um calor intenso, adivinhava-se uma tarde e noite bem quente e só bem atestados poderíamos então sobreviver.


Explorámos o espaço oferecido este ano pela organização, que englobava todos os edifícios do Campus, pela primeira vez na história do festival e ficámos no átrio perto da escadaria de economia, a apanhar a pouca aragem que corria, a conversar e a esperar pela hora da Cafetra Records nos presentear com os seus músicos.
Assim foi, pouco depois das 17 horas começava Funcionário, oriundo de terras setubalenses. Trouxe um ruído sonoro agradável que fazia parecer que estávamos todos dentro duma consola SEGA a ser controlados pelo artista. Os corpos mexiam-se consoante a melodia experimental ou mais ambient que este jovem nos apresentou apenas com o seu laptop e o seu teclado. Um bom exemplo de que de jovem se começa a fazer as pegadas para o futuro e é com essa mote que Funcionário faz a sua música, futurista, sem estar agarrado a géneros. Compõe e mostra o seu som e faz muitas vezes lembrar Inga Copeland ou mesmo Hype Williams.

Após este concerto, fez-se uma espera, uma vez mais no átrio onde estava a existir uma jam com Yan-Gant Y Tan, elemento crucial em álbuns como Isula de Sallim, juntamente com Sar, uma das cabeças desta editora discográfica que tem já selo marcado na vida lisboeta. Um set de jams cósmicas, música exploratória, a fazer lembrar Sun Araw. Existia ali um culto pelo espacial, sem linha, puro improviso mas com cabeça tronco e membros.

Observámos isto até que se começa a ouvir, nas Escadarias de Economia, a guitarra e a voz do amigo Éme, nome já conhecido pelas suas letras, que foram sempre cantadas por quem ouvia, e também pelas suas melodias melancólicas. Músicas de amor, da vida, da separação, esta é a especificidade da lírica e música cantada pelo guitarrista.  Doutor Éme tinha uma música para todos os gostos e feitio, e isso não desiludia a sala que ia enchendo.

Com o passar dos anos e após inúmeros concertos assistidos podemos dizer que Éme vem para ficar e tem Um Lugar na música portuguesa. Largou a etiqueta de “discípulo” de B Fachada e está pronto para deixar a sua marca. Consegue explorar a guitarra com perícia, parecendo muitas vezes Fausto ou Vitorino, virtuosos da guitarra se não quisermos falar de um grande cantautor Zeca AfonsoSempre animado, faz o seu set e espera-se por Dória, mas este encontrava-se atrasado pelo que existe momento de encore em que Éme diz-se sentir um verdadeiro “rockstar”. Após este concerto, assistimos a um pouco do Workshop de Bollywood que acontecia no relvado e seguimos para a Garagem para assistir a um dos melhores concertos do Festival.

Seria então o concerto de Gabriel Ferrandini e David Maranha.

Descendo a garagem, que seria o recinto do concerto, entra-se num autêntico “Buraco Negro”. As pessoas vão chegando e aproveitando os espaços para se sentarem. No centro existe apenas uma bateria, muitos pratos e um Moog. Na altura toda a gente pensava como seria suposto acontecer um espetáculo de jazz com aquele alinhamento de instrumentos. 

Pois bem, as portas fecharam-se, as luzes apagaram-se e começou o show. Na cabeça de muitos deve ter surgido logo aos primeiros toques na bateria e no Moog, um cenário apocalíptico, pós-sísmico,em que tudo tinha desabado e apenas existiam escombros entre o público. Puro jazz exploratório ou catastrófico, e que bem explorado era. As alternâncias faziam os corações bater, ora mais depressa ora mais devagar. Estávamos sozinhos, de olhos fechados, a ouvir estes dois virtuosos que poucos conhecem, a fazer o final de tarde no Supernova. 

Uma meia hora que soube a pouco mas que fez muita gente delirar. Alguns abandonavam a sala a meio, outros tentavam abstrair-se ao máximo. Música imprópria para cardíacos que no final fez com que se ouvissem “Excelente!” ou mesmo “Isto é música pura, isto sim.”
Sem dúvida. Quem foi sentiu, e poderá acrescentar este concerto à sua lista de concertos do ano.

Após a saída surge a hora de jantar acompanhada por DJ set que passava músicas de Air, entre outros artistas. Parecia um picnic no Lux, um after antes do after. As horas passavam e do nada entraram os Bosque, banda vencedora do concurso deste ano promovido pela NOVA.

Deu para fazer música ambiente. Jovens sempre sincronizados, com uma voz forçada e com semelhanças super puxadas a bandas do panorama musical português como Capitão Fausto ou Ganso, deram um concerto para gente sentada e que conversava. Poucos eram os atentos às suas malhas. Às tantas chegou-se à conclusão que se fossem apenas instrumentais ainda se aproveitaria algo mas de resto nada a apontar. Um concerto que não aqueceu nem arrefeceu, concluindo também.

Em seguida surgiram os PISTA para salvar a noite e aquecer para a banda que iria fechar a noite, os Capitão FaustoUm concerto que foi uma festa, com as malhas do costume mas tocadas de forma exímia pela banda que cada vez mais tem o seu nome vincado na música portuguesa e que a cada concerto se afirma como “o melhor ciclista em prova”, por assim dizer. Foi bike rock. Tocaram tudo o que tinham a tocar, Cláudio Fernandes fazia o público saltar, começam os primeiros moshs.

Pede-se “mais guitarra” a Cláudio ou músicas como “Queráute”, uma das melhores malhas que faz alusão ao género musical criado na Alemanha, o krautrock. E PISTA fazem o favor e contribuem para um dos momentos da noite. Pessoal a sentir o pedal, a dar tudo como se diz na gíria. Acabam assim o seu concerto que não soube a pouco, não senhor, soube bem e caiu bem depois de um jantar pesado. 

Aproximava-se a hora e a impaciência do público começava-se a notar. Começava a existir um amontoado de pessoas no relvado inclinado do Campus de Campolide para receber a banda que todos gostam, que toca aquelas malhas que todos adoram, os Capitão Fausto. Depois da paragem em Paredes de Coura, o quinteto regressa aos tempos de escola para cantar os Dias Contados. Entram ao som de Kate Bush como já tinham entrado no Lux. Começa o massacre. Mosh música sim, música não, crowdsurf incessante. Não havia ninguém parado. Começam com uma faixa do novo álbum. 

À medida que as músicas passam, dá para reparar que a banda está entregue às feras, toda a gente conhece, toda a gente acompanha, canta, dança. As grades vão abaixo e começa a existir maior pressão por parte da segurança do recinto. “Os Capitão Fausto até desafinados têm malta a moshar e a cantar, é incrível” ouve-se alguém a dizer isto a um amigo na pausa entre músicas.

O momento da noite surge já a meio do concerto quando entre mosh e crowdsurf incessante a polícia desiste de insistir com o público. “Show must go on” diria Freddy Mercury se visse. Tocam músicas mais antigas e aí é o delírio. “Sobremesa”, “Maneiras Más”, “Lameira”, todas tiveram espaço no vasto repertório apresentado. A banda agradecia a festa feita pelos que assistiam, muitos continuavam o mosh mesmo sem música. É esta a maior banda portuguesa? Arrastam multidões onde quer que vá. Note-se que esgotaram duas noites no Lux, entre outros espaços. Mas tudo tem o seu peso e a sua medida, há público e público, no Nova Música havia um público descabido que desafiou a lei, literalmente, e fez a festa à sua maneira.

Acabam o concerto com um encore onde tocam músicas mais conhecidas como “Amanhã Estou Melhor”, “Alvalade” e ainda músicas mais antigas.

Assim acabou mais um Nova Música. Foi Supernova, quente do início ao fim. Que o Nova Música chame sempre por nós.

Supernova 2016


Texto: Duarte Fortuna
Fotografia: Daniela Oliveira
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