Cinco Discos, Cinco Críticas #29

| Setembro 26, 2017 6:00 pm

Estamos de regresso ao Cinco Discos, Cinco Críticas desta vez para vos apresentar as novas edições de Maurice Brown, Alvvays, Wand, Liturgy Of Decay e Orelha Negra. As críticas, ao discos mais recentes dos referidos artistas seguem abaixo. Podendo, é ler e ouvir.

Antisocialites // Transgressive/Polyvinyl // setembro de 2017

8.2/10

Os Alvvays lançaram em 2014 o seu primeiro álbum, homónimo. Este ano, com Antisocialites, soam e compõem melhor. O disco mostra um mais afinado trabalho de gravação e produção e a qualidade das canções é mais consistente do que anteriormente. Ainda nenhuma das novas músicas me conquistou como “Archie, Marry Me”, mas algumas delas, como “In Undertow”, “Hey”, cuja secção rítmica parece saída de um disco de krautrock, e “Plimsoll Punks”, também ficam na cabeça.
A sonoridade da banda é ainda um indie pop agradável, simples e bonito. A vocalista Kerri MacLellan canta bem e a sua voz combina perfeitamente com os instrumentais. As guitarras fazem lembrar várias vezes o jangle pop dos anos 80 e os teclados são bem introduzidos nos momentos certos. Há boas melodias e o disco é curto, o que faz com que garantidamente não fique aborrecido. No entanto, nem tudo é bom. As duas músicas mais lentas e calmas, “Forget About Life” e “Already Gone”, que nem percussão tem, distinguem-se das outras por isso, mas são as duas música mais fracas do álbum e nada se perdia se estas não o integrassem. No entanto são apenas dois maus momentos em meia hora de música bonita, apesar de pouco única.

Rui Santos

Plum // Drag City // setembro de 2017

7.0/10

Os californianos Wand, para quem teve oportunidade de os ver no festival NOS Primavera Sound, estavam a prometer uma mudança no som da banda e na sua identidade, este álbum é o culminar deste processo. Em comparação com os dois lançamentos de 2015, existe um maior afastamento da agressividade de Golem que se inseria mais no movimento revivalista de garage rock e vai mais de encontro com 1000 Days e as suas estruturas pouco convencionais e mais calmas.
Sendo assim, se o distanciamento de influências como Ty Segall (mecenas da banda) ou Thee oh Sees são notórios, então podemos afirmar que existe um aproximar de bandas como Radiohead, especialmente na música “Bee Karma”, ou das explorações artísticas dos Deerhoof. Para os fãs dos trabalhos mais antigos desta banda, e que vêm à procura do som mais explosivo do conjunto, estas experiências podem deixar um travo amargo na garganta. Ao tentar balançar os momentos mais serenos e calmos com os mais elétricos é notável que este álbum pende para o primeiro lado, contudo, quando o conjunto inicia as suas “experiências” e estas duram uns longos e intermináveis minutos a única vontade é atirar a balança para o lado oposto da sala. Se a banda procurasse focar nos momentos mais concretos da sua música e não se deixasse levar por estes devaneios este álbum tinha sido certamente muito mais forte.

Hugo Geada

The Mood // Ropeadope // março de 2017 
8.0/10

Directamente de Nova Iorque surge o álbum que irá trazer a sensação de Verão eterno graças à energia positiva com que são compostas todas as músicas deste The Mood de Maurice Brown. Da família do jazz e com uma grande fusão de hip-hop e rap o artista traz-nos um álbum que apresenta uma nova perspectiva do que é o jazz da actualidade. Basta ouvir logo a primeira música com o nome do álbum para perceber o pretendido, a noção de inovação está latente no trabalho de Maurice Brown.
Com muito improviso no trompete, instrumento que o artista toca, consegue fazer com que todos os dias e todos finais de tarde deste ano acabem sempre com um sol quente. Apesar de ser de março, o álbum consegue transmitir essa vibe de que em qualquer altura do ano pode ser ouvido para nos fazer mergulhar em águas de praia. É ao ouvir logo a segunda faixa de dez, “On My Way Home”, que nos apercebemos do que acima é dito, Maurice Brown é um virtuoso do improviso, trazendo jazz com mistura world music a que estamos habituados em artistas como Orlando Julius, ou bandas como Bixiga 70. Também de realçar os nomes que ajudam a fazer este álbum com o exemplo de Talib Kweli, com a faixa “Stand Up” com conotação mais política e com a lírica ligada ao jazz criando assim outro bom casamento de duas coisas que surgem dos grandes subúrbios americanos. Um álbum que apesar de chegar tarde aos nossos ouvidos tão cedo não sairá por ser o nosso álbum de Verão Eterno. Maurice Brown, ladies and gentleman.

Duarte Fortuna


First Psalms // D-Monic // outubro de 2016

8.5/10 



Formados em 1997 e atualmente o projeto a solo do vocalista, compositor e multi-instrumentista Olivier Luthereau, os franceses Liturgy Of Decay, lançaram em outubro do ano passado o seu primeiro disco de estúdio, First Psalms, aquele que é definitivamente um álbum obrigatório para todos os melómanos da música obscura.
A música de Liturgy Of Decay vai beber influências ao melodic e doom metal, mas igualmente à gothic wave contemporânea, sendo inspirada em formas e orquestrações musicais seculares. Mais do que puramente música, First Psalms é um disco artisticamente multidisciplinar e enriquecido de um conteúdo tão metafísico e dialético como estritamente estético, uma vez que é composto por sequências visuais sincronizadas com os conteúdos áudio – uma experiência acrescida para todos os que comprarem o álbum.
Com uma sonoridade a merecer comparações a bandas como Öxxö Xööx e Paradise Lost, este trabalho de estreia é um disco que não merece ficar fora dos holofotes da música underground. Singles como “Mental Damage” “Suffering The Idyll”, “Dispossessed”, “Tales Of Betrayals” e “Tristiana” escontram-se embutidos em arranjos orquestrais únicos e vêm denotar o Flamboyant Gothic Metal (música atmosférica, sinfónica e mística), género cunhado pelos próprios. First Pslams é um álbum com uma produção invejável, carregado de uma tensão emocional e espiritual que conduz à exploração de um universo eterno onde guitarras saturadas e ritmos martelados, orquestrações clássicas e eletrónicas, órgãos, cravos e coros se fundem na revolta de um passado dolorido e a invocação para um futuro glorioso. Um álbum essencialmente introspectivo e integralmente tocante, refletindo os cerca de 20 anos levados para refinar as sua sonoridade. Um disco singular, exímio e carregado de um valor inquantificável. É impossível não sentir em First Psalms, ora experimentem.

Sónia Felizardo

Orelha Negra // Meifumado // setembro de 2017

7.5/10

Samuel Mira a.k.a. Sam the Kid, Dj Cruzfader, Francisco Rebelo, João Gomes e Fred Pinto Ferreira são os Orelha Negra e regressaram em 2017 com o seu terceiro disco de originais, homónimo como de costume. Este é um disco diferente dos seus antecessores (2010 e 2012), não é tão imediato e necessita de atenção. Resulta melhor ao vivo que em estúdio – foi apresentado ao vivo antes de ser editado, no mítico concerto no grande auditório do CCB em janeiro de 2016 (algo que acontece desde o primeiro álbum, funcionando estes concertos como uma espécie de laboratório). Nos treze temas que o compõem a essência urbana do hip-hop e da soul continua presente, assim como os já habituais sampling e gira-disquimo, havendo agora também espaço para uma aura mais psicadélica e cósmica.
As músicas que mais se destacam são aquelas em que os sintetizadores são protagonistas, como “Apolo 70” e a sua matriz krautiana, “Clair”, “Soul2” e “Skylab”, que traz à tona os Daft Punk. O single “Sombra” funciona aqui como um regresso ao passado, relembrando os primeiros trabalhos. Em Orelha Negra III a maturidade e experiência são palpáveis. A produção roça a perfeição, algo a que já estamos habituados. A essência dos Orelha Negra está lá toda.

Rui Gameiro

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