Sunflowers em entrevista: “Já não há músicas sobre pizzas e coisas assim”

Sunflowers em entrevista: “Já não há músicas sobre pizzas e coisas assim”

| Abril 26, 2018 11:15 pm

Sunflowers em entrevista: “Já não há músicas sobre pizzas e coisas assim”

| Abril 26, 2018 11:15 pm



Em 2014 estávamos a anunciar os Sunflowers (f.k.a. The Sunflowers) como uma das revelações nacionais do ano por causa do EP homónimo. Na altura a banda estava a emergir dentro do panorama e a imprensa ainda não estava muito dentro do rock garageiro proveniente da bateria ritmada de Carolina Brandão e da guitarra estridente de Carlos de JesusDepois dessa primeira edição foi sempre a subir com tours internacionais e mais incontáveis edições, festivais e bem, o sonho para qualquer banda. 


Em mote da edição do novo disco Castle Spell, editado em fevereiro deste ano, trocámos uns emails com os Sunflowers para ficar a conhecer a nova vida do sempre simpático duo portuense.

Ainda leem a Threshold? 

Sunflowers – Lemos, sim. São a única webzine portuguesa que leio com regularidade, até. Pelo menos, não me lembro de ler outra tantas vezes nos últimos tempos. 

O que é que sentem quando vos fazem entrevistas nas quais já sabem aquilo que vos vão perguntar (Esperemos que este não seja o caso lol ☹ )? 

Sunflowers – Já temos tudo ensaiado quando isso acontece. Só acho pena que o pessoal que faz as perguntas não investigue melhor a banda antes da entrevista. Ninguém quer saber o porquê de nos chamarmos Sunflowers, como nos conhecemos, como definimos o nosso som… Isso são coisas que se pode ler noutras entrevistas que fizemos. Compreendo que o pessoal não queira ter trabalho com a entrevista, mas se nos fazem perguntas de merda vão receber respostas de merda. 

Quando estiveram lá fora a dar tudo no rock’n’roll quais foram as histórias que mais vos marcaram? 

Sunflowers – Bem, esta vai ser a resposta mais longa de todas. Mas vamos por pontos, para abreviar: 
• As duas visitas a África do Sul por tudo o que envolveu (fomos super bem recebidos) e, especialmente, quando o público cantou as nossas músicas connosco; 
• Quando nós e o Rui dos 800 Gondomar tivemos que dormir na carrinha à porta de um hotel em Ravenna porque nos cancelaram o concerto desse dia e não queríamos ter que pagar por dois quartos. Foi uma noite engraçada; 
• A festa no Horst Klub que só acabou às 6h da manhã quando expulsamos as pessoas do sótão escuro onde íamos ficar para podermos dormir 2 horas e acordar com chuva a cair-nos na cara; 
• Quando ficamos presos no parque de estacionamento da venue de Frankfurt e quem nos salvou foram dois emigrantes portugueses que tinham ido ver o concerto; 
• Quando dormimos os 6 num quarto minúsculo em Frankfurt, na sala do Ciryl em Paris (os laços da amizade ficam bem fortes quando dormem 4 pessoas em conchinha num sofá cama) ou naquela divisão forrada de colchões insufláveis furados em Den Helder (onde o colchão manchado caiu em cima do Fred); 
• A sério, há muitas boas histórias só nos alojamentos; 
• Quando tivemos casa cheia em Paris na nossa segunda vez lá; 
• Quando as pessoas vinham ter connosco depois do concerto a dizer o quanto tinham gostado e a querer comprar vinis ou wtv ou quando vinham ter connosco antes do concerto a perguntar se íamos tocar alguma música específica; 




Vocês já são do tipo aquela banda que pode pedir o que quer quando dá um concerto ou é tudo à moda antiga, promotores D.I.Y? 

Sunflowers – Nós temos uns pedidos no nosso rider mas nunca esperamos que os cumpram. Aliás, está lá escrito “Rider de alojamento (quando aplicável)”. A coisa mais complicada que pedimos e insistimos para que se cumpra até está mais na parte técnica do concerto. Somos bastante chatos nisso. Tornamo-nos naquelas bandas com quem gozávamos quando não percebíamos patavina do meio e, sim, vamos insistir para usar o nosso backline e para ter a disposição no palco como queremos. Acho que ainda não estamos no ponto do “se não for à minha maneira não toco” mas já nem digo nada. Nunca se sabe as voltas que a vida dá. 

Pois é, já agora, quando dão um concerto quais são aquelas coisas indispensáveis que exigem aos promotores além do cachet

Sunflowers – Acima de tudo, respeito pelo nosso trabalho. Se nós respeitamos horários, limitações e o trabalho dos outros, então pedimos que façam o mesmo connosco. Não há nada pior que parecer que te estão a fazer um favor enorme por estares a tocar no bar/venue/fest quando foram eles que te contrataram. Ou um técnico de som que não respeita o som da banda e a quer meter a soar como as 232 bandas a quem já fez som ou que antes de começar o soundcheck te pergunta “olha e já agora, que tipo de música tocam?”. Se contrataram a banda então não nos tratem como miúdos que estão a brincar aos rockstars e façam o mínimo de trabalho de casa. E também pedimos toalhas. Mas isso raramente dão. 

Dariam um concerto num sítio random (tipo uma casa na floresta) se alguém vos pedisse? 

Sunflowers – Nós damos concertos em todo o lado. Não somos esquisitos. Já fomos ao Sumol Summer Fest, querem mais random que isso? 

Olhando em retrospetiva, o que eu sinto é que o EP era uma jam session e agora vocês querem ser mais profissionais. Sentem-se mais profissionais? 

Sunflowers – Os EPs foram feitos a correr para termos algo para as pessoas ouvirem. Agora percebemos que temos que fazer as coisas com calma para soar àquilo que queremos. Isso é ser profissional? 

Continuam a gostar desse primeiro EP, ou é mais do género: “ya, gostamos porque fizemos a música, mas está super ultrapassada agora?” 

Sunflowers – Adoro o primeiro EP. O segundo, de vez em quando apetece-me apagá-lo da existência. Mas ya, trouxe-nos até aqui por isso tenho que lidar com ele. Acho que ambos os EP’s foram muito focados no “estamos aqui, gostem de nós”. Até o primeiro disco me deixa com esse sentimento em algumas músicas. Com o Castle Spell entramos num ponto que estamos a fazer música para nós, a experimentar coisas, a escrever sobre o que andamos a ler e a pensar. Já não há músicas sobre pizzas e coisas assim. Agora é sobre a paranoia e a ansiedade que nos consomem o dia-a-dia. Mas mascarada de ficção científica, castelos e cigarros. 



Eu ainda me lembro de ir ao Cão da Garagem na altura em que os 800 Gondomar ainda não existiam na press e vocês ainda eram os The Sunflowers. Como é que está o Cão da Garagem hoje? Ainda me abriam as portas se eu quisesse assistir a uns ensaios? 

Sunflowers –  Está mais arranjadinho, acho. Fizemos uma montanha de obras na sala de ensaio, que mudou lá para trás, já temos a nossa coleção de discos lá e até já arranjamos maneira de podermos fazer música a qualquer altura do dia (ou noite). Nós abrimos as portas ao pessoal que quiser ir, na boa. Tragam umas cervejas que ficámos lá a ouvir discos e a falar de jardinagem e bricolage. E, claro, da inevitável insignificância da condição humana. 

Aposto que já vos perguntaram isto, mas e esse desaparecimento do The antes dos Sunflowers? 

Sunflowers – Para além de nunca termos gostado do “the”, já ninguém dizia The Sunflowers. O The estava a ficar mudo e decidimos que estava na altura de o fazer desaparecer. 

Vocês vivem da música? Assim mesmo só da música, música a dar dinheiro para pagar contas e para exibir aos paizinhos naquelas saídas que envolvem dinheiro? 

Sunflowers – Era bom, mas não. Entre a banda, a editora e a faculdade temos que ir arranjando emprego onde conseguimos. A fazer biscates, a lavar loiça, a limpar chãos, etc. Já aconteceu muitas vezes termos concerto e ser uma espécie de maratona de 12h: chegar, montar, esperar, soundcheck, esperar, esperar, jantar, esperar, tocar, arrumar, beber uma cerveja (só para a parte social da cena), bazar, dormir 2/3 horitas, acordar, ir trabalhar mais 8h. A nossa vida não é tão glamorosa como muita gente pensa. 

Há alguma coisa que queiram acrescentar para os leitores desta entrevista? 

Sunflowers – Lutem contra o sistema que vos falha ou fazem parte dele. Respeitem as outras pessoas da mesma maneira que gostavam de ser respeitados. E ajudem-se uns aos outros, não custa nada e todos ficam a ganhar. A vida só é uma competição se a tornarem numa. Mandem drogas. Comecem a beber para afogar as mágoas. Fumem mais. Morram cedo. Comprem merch.



Entrevista por: Sónia Felizardo
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