Os discos que podem ter perdido no primeiro semestre do ano #2

| Julho 27, 2016 12:31 am
Todos os anos há álbuns que andam nas “bocas” de toda a gente, mas há sempre aqueles discos a quem a imprensa não dá grande destaque e por isso chegam ao alcance de muito poucos. Deste modo, os redatores da Threshold Magazine selecionaram alguns desses álbuns esquecidos de 2016 e deixam-nos abaixo, juntamente com a justificação para os ouvirem.


Ludrium – Unity

Logo no início do presente ano, em janeiro, Ludrium ou Cody Carpenter, filho do Mestre do Terror John Carpenter, lançou, ainda que não detectado pela maior parte dos “radares” musicais, o seu terceiro longa duração, Unity.

Tal como no disco anterior, Ludrium, volta a provar que sabe usar e trabalhar com mestria as suas várias influências e instrumentos pois, sendo um disco principalmente de synthwave, consegue reunir elementos de disco, vaporwave e até de rock progressivo (em Pleasure Of A False Past ainda acrescentava algum jazz). 

Ouvido pela ordem da tracklist, apesar dos seus temas bastante diversos, é bastante coerente e constrói boas “pontes” entre as músicas, por exemplo, no fim de “Save Your Mysterious Power for Dancing” há um abrandamento do ritmo para entrar “The Sacred Tree” sem “corte” na fluidez do disco. Como faixas isoladas devem ser ouvidas com especial atenção “Sentinel”, “Save Your Mysterious Power for Dancing”, “Plot Course To Earth” e “We Have One Chance”.

Ludrium mostra, assim, que tem mais que o necessário para criar soundtracks de videojogos ao estilo e com a qualidade de Far Cry 3 Blood Dragon, Hotline Miami ou Double Dragon Neon. 

Francisco Lobo de Ávila
Terra Tenebrosa – The Reverses

Formados em 2009 na Suécia, os Terra Tenebrosa contam já com três discos de estúdio longa duração – The Tunnels (2011), The Purging (2013) e The Reverses, disco editado este ano – e um EP, V.I.T.R.I.O.L. – Purging The Tunnels (2014). A banda avant-garde de post-metal mostra aos ouvintes uma visão do seu universo obscuro, através da conjugação de vozes distorcidas, ruídos de indução à paranóia e um conjunto pesado de outros sons ameaçadores. A vertente experimental da banda é um dos factores que dá a este The Reverses a qualidade de ser um álbum a não deixar de lado nas audições dos discos do ano, pela peculiaridade através da qual conjugam diferentes sonoridades, de forma tão interessante.

Logo na cover-art, que segue a linha dos trabalhos antecessores, é possível ter uma noção da obscuridade que se pode encontrar ao longo das sete canções que compõem o álbum. Afinal, a utilização de máscaras demoníacas já é uma das características dos Terra Tenebrosa. Além do já esperado/especulado, aquilo que não se poderia prever tem uma duração aproximada a 47 minutos, apresentando uma escolha exímia, ao nível da tracklist, no seguimento das canções. 

“Exuvia” é apontado como primeiro single de avanço e consegue convencer facilmente aqueles cujas sonoridades pesadas escapam muito facilmente ao gosto. “Fire Dances” consegue manter-se na mesma linha, embora mais experimental e com a duração mais prolongada do disco: 17 minutos de uma sonoridade que se desmembra e não mais volta a ser a mesma apresentada no início. 

Apesar de um disco arriscado, os Terra Tenebrosa apresentam um álbum que foge ao panorama do post-metal mais banal e introduzem conceitos muito interessantes no seu volver. Não é um disco para qualquer um, mas para aqueles que estão sedentos de novidades será, certamente, uma escolha bastante acertada. 

Sónia Felizardo


Pinkshinyultrablast – Grandfeathered
 
Auto proclamados como thunder pop/kung-fu-gaze, os Pinkshinyultrablast trouxeram-nos no início deste ano Grandfeathered, o álbum que vem finalmente transcender todas as labels, a criança perfeita do shoegaze com tudo o mais.

Depois de Everything Else Matters, lançado no ano passado, o quinteto russo traz-nos agora o seu segundo álbum de longa duração, mais denso, mais barulhento, mais eletrónico, mais noisepop, mais efémero, com a precisão do math rock mas com os sintetizadores de dream pop, e a inigualável voz de Lyubov Soloveva, que é quase o quinto instrumento do grupo.

“Initial” é o perfeito começo para este trabalho; delicada, mas violenta de repente, uma literal apresentação do que são os Pinkshinyultrablast. Esta justaposição de estilos mantem-se constante durante todo o álbum, contudo cada música é esmagadora à sua maneira, destacando-se sem dúvida “Kiddy Pool Dreams” e “The Cherry Pit”. 

As semelhanças com Misun, Astrobite, Cocteau Twins, Mogwai, Slowdive e, indubitavelmente, os já meios esquecidos Lush é óbvia, mas Pinkshinyultrablast continuam a trazer algo de novo para a mesa, algo que nos faz querer dançar e atirar alguma coisa à parede ao mesmo tempo, pois Grandfeathered é sem dúvida um mundo dentro de um álbum.

Márcia Boaventura


peixe: avião – Peso Morto


Os peixe:avião vêm de Braga e
mostraram na última década que são um dos projetos portugueses mais promissores
no que diz respeito à experimentação. A prova disso são os últimos dois álbuns
editados pela banda, homónimo em 2013 e Peso Morto no início do ano. 

Peso
Morto
 pode ser considerado como o melhor trabalho da banda que
inicialmente era comparada a Radiohead. As abordagens sonoras
seguidas neste trabalho tiverem origem na composição de música original para o
clássico Ménilmontant de Dimitri Kirsanoff, filme de 1929, após
encomenda do Curtas Vila do Conde – Festival Internacional de Cinema. 

Influênciado por bandas como os Portishead e SwansPeso
Morto
 vive na escuridão, na percussão feroz e tribal, nos sintetizadores
hipnotizantes e psicadélicos, nas guitarras ruidosas e na voz cristalina de
Ronaldo, fugindo às sonoridades mais límpidas e pop de 40:02 (2008) e Madrugada
(2010). 

Apesar dos singles Quebra” e “Miragem” serem uma excelente introdução
ao quarto disco de estúdio da banda, o maior destaque vai para a coesão sonora
apresentada ao longo das oito faixas. Nenhum instrumento se sobrepõe aos
outros, nem mesmo à voz, estando todos intercalados de modo a criar uma
atmosfera densa e negra.

Os peixe:avião são uma banda em constante evolução e Peso Morto vem demonstrar que o quinteto não têm medo de continuar a
construír a sua própria identidade.

P.S: não percam a oportunidade de ouvirem
Peso Morto ao vivo. Vale bem a pena.

Rui Gameiro


Kelsey Lu – Church


Kelsey Lu, uma
jovem violoncelista profissional, que decidiu expôr a sua expressão artística
nas “ruas” de Nova Iorque e que despertou atenção ao olho de mágico
Dev Hynes (Blood Orange). O trabalho árduo culminou num EP de estréia chamado
Church; 6 brilhantes faixas construídas engenhosamente com a misticidade que se
pode tirar de um violoncelo e da ajuda de loops com uma co-produção magnífica
de Patrick Wimberly dos Chairlift

A atmosfera que o EP nos proporciona é muito
religiosa e espiritual, com breaks do instrumento que Lu masterizou entre as
vocais angelicais que parecem o casamento de uma Florence Welch e uma Willow
Smith mais madura. É um experimental ao nível de Joanna Newsom mas mais
minimalista e com um impacto mais intenso e direto. Letras repetitivas e
instropetivas que muitas vezes cortam a respiração como “The feelings that
you aren’t real” que se ouve em “Time”. 

Um sentimento muito
visceral, primitivo e carnal que facilmente é traduzido numa faixa na
perfeição, “Empathy”; é difícil de explicar mas é a dualidade entre o
conforto e aspeto eerie que torna esta e outras faixas de Lu tão únicas e
realmente geniais. Uma artista que promete muito, esperemos que a jovem Kelsey
de Brooklyn consiga continuar a surpreender-nos!

Júlio de Lucena


800 Gondomar – Circunvalação


A banda mais perigosa de Rio Tinto, os 800 Gondomar, lançaram o seu segundo EP no passado dia 24 de março, sob o nome Circunvalação. Com este novo registo da banda portuense, que teve direito a edição em cassete, seguiram-se várias datas de norte a sul para apresentar o EP, com destaque para a abertura de Meatbodies no Musicbox Lisboa, onde estivemos presentes para reportar a noite

O que podemos dizer deste álbum? Pode-se logo destacar a energia e a maneira punk com que este EP começa, com “Entre Águas” a abrir agressivamente as hostes, sem medos, logo desde o minuto 0. “Lenny” e “Faz o Flip”, as seguintes faixas, respectivamente, dão um bom seguimento à agressividade sentida na primeira música, seguindo a mesma ideologia punk. 

Acordes poderosos, rápidos e destemidos tomaram conta do álbum até aqui, que agora mudou de rumo em “Mergulhadores” e “Já Queria”, as duas ultimas faixas do EP, onde os 800 Gondomar adotam uma vertente um pouco mais calma, mas com todo o sucesso das músicas anteriores. Se ainda não ouviram Circunvalação na íntegra, e se forem fãs de pura jarda, aconselhamos vivamente que oiçam este álbum. Depois de o ouvirem, e se gostarem, recomendamos também que assistam a um concerto dos 800 Gondomar, e sintam na pele tudo o que nós dissemos.

Tiago Farinha
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