Cinco Discos, Cinco Críticas #25

| Maio 21, 2017 9:34 pm


À 25ª edição do “Cinco Discos, Cinco Críticas” é dada a opinião a cinco discos que sairam durante este ano e que se dispersam entre si relativamente aos géneros em que trabalham. Em destaque a compilação mono no aware da PAN e Tuning de Olivier Lété. Podem ainda ler as críticas a Whiteout Conditions dos The New Pornographers, Heartless dos PallbearerGolden Rain EP dos Golden Rain.


mono no aware // PAN // março de 2017 
8.5/10 
mono no aware é a melhor surpresa que poderíamos receber nesta primeira metade do ano. A primeira compilação da PAN, editora sediada em Berlim fundada por Bill Kouligas (que aqui contribui com uma música), traz-nos 16 diferentes temas de 16 diferentes artistas, cada um com uma sonoridade única e distinta mas que se interligam de um modo muito interessante, onde até as próprias transições entre faixas funcionam em perfeita união, contribuindo, assim, para um disco extremamente coeso e uno, como se de um artista apenas se tratasse. Música introspetiva para refletir, ora orgânica ora fria e abrasiva, mas todas elas complementares e envoltas numa atmosfera esotérica. A beleza de “Limerence”, por exemplo, traz um instrumental simples e enigmático como o seu próprio autor, Yves Tumor, que contribui com um dos temas mais íntimos e marcantes do disco, com as vozes sampladas a dar um toque mais humano e quente à composição. 
mono no aware transcende os campos da música ambient e exploratória, mantendo-se entusiasmante ao longo dos seus quase 80 minutos, nunca perdendo a sua identidade e mantendo-se profunda e coesa até ao fim, colocando esta compilação num patamar privilegiado que poderá gerar algum burburinho à volta deste diamante bruto e entusiasmante. Uma audição mais que recomendada que merece tempo e disponibilidade para ser digerida.


Filipe Costa 

Golden Rain EP // Bulbart/Pocket Records // abril de 2017 
4.0/10 

Formados em Nápoles, Itália no ano de 2015, os Golden Rain são um duo que, muito resumidamente, se insere no campo da electro-pop com mais uma dezena de géneros e subgéneros à mistura. O resultado disso vem expresso neste novo EP homónimo, composto por um total de cinco canções muito dispersas entre si no processo de composição. A título de exemplo cite-se o single “Foglights”, faixa de abertura que nos leva a viajar por entre os campos da dream-pop com tonalidades melodramáticos. À memória, o resultado deste single faz lembrar uma espécie de Princess Chelsea conjugada com Marina and The Diamonds no primeiro disco. É também com “Foglights” que os Golden Rain mostram o único trunfo deste novo EP, pois as restantes canções estragam qualquer hype inicial criado no consumidor. Ao longo da reprodução do álbum o ouvinte é exposto a ambientes e composições musicais muito dispersas entre si e onde a própria voz da vocalista se torna irreconhecível. A coerência, inexistente, na linguagem e comunicação musical confunde ainda um ouvinte que esteja a tentar encontrar identificar a sonoridade da banda e, muito dificilmente, o conseguirá levar a ouvir o EP na íntegra e/ou a querer informar-se mais sobre a banda. “When I Go Away” é um exemplo de uma péssima escolha de alinhamento, sendo um single tipicamente reciclado de sonoridades pré-existentes, no fundo, a estratégia utilizada em quase todas as composições deste disco. Uma pena. 

Sónia Felizardo

Whiteout Conditions // Concord // abril de 2017 
7.5/10 

Três anos após o dececionante Brill Bruisers, os The New Pornographers estão de volta com Whiteout Conditions e mais uma dose de power pop. Esta foi a primeira vez que fizeram um álbum sem a participação de Dan Bejar, ocupado com o seu outro projeto, Destroyer, e o baterista Kurt Dahle, que deixou a banda em 2014. Felizmente, essas duas baixas não se fizeram notar e Whiteout Conditions é um álbum de qualidade. Com canções energéticas, boas melodias e uma boa integração de instrumentos eletrónicos, este é um agradável, apesar de não muito memorável, conjunto de canções. Começa bem, com “Play Money”, liderada pela voz de Neko Case, mas torna-se menos interessante com as duas faixas seguintes, especialmente a primeira delas: a mais eletrónica “Whiteout Conditions” e “High Ticket Attractions”. É depois delas que a banda mostra o que sabe, da faixa 4 à 8. São essas as canções que fazem o álbum valer a pena. “Second Sleep” é capaz de ser a melhor delas, mas “We’ve Been Here Before” também se destaca, sendo a música mais calma e ambiente do disco, na qual não há percussão. As últimas músicas passam um pouco despercebidas, não mostrando a banda no seu melhor. Whiteout Conditions é um bom álbum. Não será um dos melhores de 2017, mas também não deve desiludir a maior parte dos fãs da banda.



Rui Santos

Heartless // Nuclear Blast Records // março de 2017
7.5/10 


Tal como a força e a beleza de uma cascata na natureza, é assim que o terceiro álbum dos Pallbearer atinge os seus ouvintes. Esta jovem banda tem feito a sua reputação crescer em torno da mistura dos riffs monoliticos típicos do doom metal, na tradição de trouble, candlemass ou cathedral, com harmoniosas melodias encontradas em bandas de rock progressivo clássicas, invocando obvias influências de Pink Floyd ou de Rush
Com o vocalista muito mais confiante do que nos dois primeiros álbuns, este disco prima pela sua eclética performance capaz de percorrer os tons mais limpos, desde o mais agudo até ao mais grave, e quando necessário, ir buscar a agressividade necessária para completar a musica. Com poderosíssimas músicas como “I Saw The End”, que serve de abertura para o álbum, ou “Dancing in Madness”, as guitarras complementam-se, um pouco ao estilo de Mastodon. No centro da violência, por exemplo, os ritmos típicos de géneros como o sludge metal, estes são constantemente complementadas por linhas harmoniosas e melódicas. Esta oscilação atípica é o que torna os álbuns de Pallbearer uma experiência tão peculiar. Apesar de tanta hostilidade, existe sempre um momento emotivo a contrastar. 
Um forte concorrente, que certamente estará listado em várias listas de melhores álbuns do ano dentro do género (e não só), Heartless, sabe conjugar, paralelamente, a agressividade com a beleza melódica criando um cenário apocalíptico repleto de emoção.



Hugo Geada

Tuning // Discoble Records // abril de 2017
8.0/10



Tuning é um álbum muito especial, feito com recurso exclusivo a um baixo elétrico conectado a dois amplificadores e sem quaisquer pedais de efeitos. Composto por um total de nove canções, Tuning apresenta melodias pulsantes e repetitivas, enriquecidas por conceitos criativos e auras inovadoras. O compositor francês Olivier Lété, que assina este trabalho, refina no seu processo de composição e improviso várias influências do seu apego à audácia sonora e musical e apresenta um disco que requer um certo nível de paciência e ambientes muito específicos para ser reproduzido e apreciado. Com um currículo a contemplar a cena jazz, Oliver Lété mostra a solo a sua paixão pela música, mas num registo mais grave e despido de qualquer instrumentação que distraia o público do seu principal objetivo: conduzir o ouvinte a uma viagem por entre as linhas do baixo. O argumento fica a cargo de quem carregar no play e escutar até ao fim. Tuning invoca de uma forma geral a estrada que percorremos na vida – as linhas retas, a floresta que nos acompanha ao longo do caminho, as curvas e contracurvas que percorremos até ao destino final. As vibrações do motor passam assim a ser as do baixo, enquadradas com variações imprevisíveis. Um disco muito interessante pela sua unicidade. Ora experimentem começar por “Un retour”.

Sónia Felizardo

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