Cinco Discos, Cinco Críticas #34

| Fevereiro 28, 2018 12:24 am

Os mais recentes trabalhos de Kero Kero Bonito (self-release, 2018), Hooded Menace (Season of Mist, 2018), WK569 (Boring Machines, 2017), Julian Lage (Mack Avenue Records, 2018) e MGMT (Columbia Records, 2018) são os destaque desta 34ª edição do Cinco Discos, Cinco Críticas. As opiniões sobre as respetivas edições podem ler-se abaixo.

TOTEP // self-released // fevereiro de 2018

8.7/10

Conhecidos pelo seu electropop divertido e fofo, os Kero Kero Bonito chamaram-me a atenção com o seu single “Flamingo” e conquistaram-me com o álbum de estreia, Bonito Generation. Agora, com um novo EP, desenvolvem a sua sonoridade por novos caminhos sem nunca perderem a sua personalidade. Mantêm os sintetizadores nas faixas que começam e terminam o disco, mas estas são canções calmas e relaxadas, mais indie pop do que anteriormente. As outras duas contam com bateria, baixo e guitarra e muito ruído e distorção. “Only Acting” faz lembrar Weezer no refrão, mas tem também momentos noise completamente inesperados. Estes funcionam surpreendentemente bem, principalmente nos momentos finais da música, onde a voz de Sarah e o ruído se complementam de maneira muito eficaz. “You Know How It Is” é outra dose de noise pop, desta vez com pequeno solo de guitarra, mais um refrão extremamente catchy e algumas das melodias mais bonitas do EP. É fácil imaginá-la a integrar a banda sonora de um anime. “One True Path” tem momentos bonitos e é um excelente começo do EP que termina com “Cinema”, provavelmente a canção mais melancólica da banda até agora. A sua sonoridade fez-me pensar em Mac DeMarco e nas suas experiências com teclados iniciadas em Salad Days (2014). É atmosférica e agradável, mas, infelizmente, acaba repentinamente e muito cedo. Tem bons pormenores, mas podia ser mais desenvolvida. 
TOTEP é o início de uma nova fase da banda, talvez uma amostra do que será o seu próximo álbum. Espero que sim, porque a curta duração deste EP pode fazê-lo saber a pouco. No entanto, não deixa de ser um belo conjunto de canções que merecem ser ouvidas vezes sem conta.
Rui Santos


Ossuarium Silhouettes Unhallowed // Season of Mist // janeiro de 2018

8.5/10

Vindos das terras gélidas e obscuras de Joensuu, na Finlândia, os Hooded Menace apresentam uma investida sónica que tem tanto de agressiva como de angustiante nas sete faixas que compõem o seu quinto álbum de originais, Ossuarium Silhouettes Unhallowed. Fornecidos com uma sonoridade baseada no funeral doom e no death metal, e com uma destreza aterradoramente inata em elaborar letras ao redor de histórias de terror sobrenatural, a banda nórdica alterna com a maior naturalidade – e para o bem e para o mal, sem grandes alterações da estrutura musical adotada – entre instrumentais vagarosos cruzados com solos melódicos e riffs mais coléricos e crus com trabalho de percussão frenético, tudo isto rematado pelas vocalizações guturais imponentes e respeitáveis do seu membro mais recente Hail Conjurer. Com este disco, a banda revela provar a sua constante vontade em avançar com a ambição de transmitir uma aura de pavor e desalento ao ouvinte, revelando a sua consistência e maturidade em termos de songwriting e execução musical, sentidos em todo o seu esplendor petrificante em faixas como “Cathedral of the Laybrinthine Darkness”, “Sempiternal Grotesqueries” ou “Charnel Reflections”.
Rubén Leite



Omaggio a Marino Zuccheri // Boring Machines // outubro de 2017

7.0/10

A música experimental e computorizada no campo da eletroacústica ainda é dirigida a um nicho de mercado muito específico e o mais recente EP de 12” de WK569, Omaggio a Marino Zuccheri, é uma peça de contemplação para esse público. O projeto WK569 foi fundado em 2009 por Federico Troncatti, Ezio Martinazzi e Pier Enrico Villa e advém de uma síntese da linguagem musical resultante da interação do homem e da máquina, sendo articulada em diferentes níveis de percepção. Numa homenagem a Marino Zuccheri, que inspirou as ideias e processo de composição deste single, Omaggio a Marino Zuccheri é acima de tudo um exercício sonoro sobre quando a música eletrónica dá as mãos à eletroacústica, o que resulta numa espécie de música concreta contemporâneo-modernista. O disco é composto exclusivamente pela música “Omaggio a Marino Zuccheri”, que possui uma duração aproximada a 18 minutos, e dois breves teasers que apresentam secções de cerca de 50 segundos da música principal e são duas propostas que ou repulsam ou atraem o ouvinte. Improvisação de tema e eletrónica auto-gerada são ferramentas que podem ser ouvidas em “Omaggio a Marino Zuccheri”, um exercício competente e à altura das habituais edições com selo Boring Machines.
Sónia Felizardo






Modern Lore // Mack Avenue Records // fevereiro de 2018

8.5/10


Outrora um jovem prodígio da guitarra que aos 9 anos partilhava palco com o icónico Carlos Santana, atualmente, com 30 anos, Julian Lage é um senhor que oferece uma lufada de ar fresco à música jazz e a transporta para territórios mais contemporâneos. 
Acompanhado pelo contra-baixista Scott Colley e pelo baterista Kenny Wollensen, Julian, munido pela sua fiel Telecaster, transforma os trastes da sua guitarra numa palete de cores com a qual desenha a sua personalidade e as suas diferentes influências musicais. A primeira cor a ser atirada para a tela é o azul, “The Rumble”, faixa que marca a abertura do álbum, é uma carta de amor ao blues de B.B. King, apesar de munido por uma quente distorção que lhe confere um ar mais moderno. “Wordsmith” brinca a um nostálgico rock and roll (oferecendo ao mesmo tempo uma lição de guitarra dedilhada) e é seguido por “Splendor Riot”, onde os calmos acordes transportam a imaginação do ouvinte para um cenário de faroeste repleto de músicos americana. 
Nestes exemplos citados anteriormente, é claro o contraste de géneros e estilos dentro deste álbum que são unidos por um fator em particular, a mestria da guitarra de Julian. Um mago, que com o seu instrumento musical convertido em colher de pau, mistura diversos ingredientes até formar uma poção mágica que deixará todos aqueles que a consumirem encantado.

Hugo Geada







Little Dark Age // Columbia Records // fevereiro de 2018

8.5/10


Após o desapontante álbum homónimo que pressagiava um futuro de irrelevância, os americanos MGMT regressam volvidos 5 anos com Little Dark Age, o trabalho mais consistente do grupo e a maior surpresa do ano até à data. O duo, constituído por Andrew VanWyngarden e Benjamin Goldwasse, acaba por finalmente encontrar o balanço ideal entre a sua vontade de criar música com uma vertente pop e não editar outro Oracular Spectacular através de composições acessíveis repletas de influências de synthpop dos anos 80. 
A óbvia comparação com os trabalhos de Ariel Pink no seu projeto Ariel Pink’s Haunted Graffiti poderá explicar-se pelo envolvimento do músico na escrita e gravação do álbum, principalmente em “When You Die” ou “James”, onde temos Andrew VanWyngarden com um registo vocal fora do normal. A sonoridade enérgica e melodias viciantes presentes em hits anteriores como “Kids” e “Time To Pretend” voltam a ser encontradas em canções como a absurda “She Works Out Too Much”, “One Thing Left To Try” ou “Me and Michael”, um hino ao bromance, mas com a menor dependência dos refrões a tornar as novas composições mais coesas. As letras em Little Dark Age dão ao disco uma tonalidade mais sombria e abordam diversas temáticas, como a eleição de Donald Trump (“Hand It Over”) ou a malévola dependência do telemóvel (“TSLAM”). A duração do álbum acaba por ser adequada e convida a múltiplas audições sucessivas, tornando este disco um forte candidato a um dos melhores do ano.

João Barata





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