Cinco Disco, Cinco Críticas #35

| Abril 1, 2018 3:08 pm

Para iniciar abril fazemos um apanhado dos novos discos que têm saído no primeiro trimestre do ano. Em mais um Cinco Discos, Cinco Críticas escrevemos sobre os novos trabalhos de Efrim Manuel Menuck – Pissing StarsScreaming Females All At OnceCavern of Anti-Matter Hormone LemonadeDead Meadow – The Nothing They Need Moon Duo – Jukebox Babe / No Fun. Podem ouvir estes discos e ler as respetivas opiniões, abaixo.

Pissing Stars // Constellation Records // fevereiro de 2018
6.0/10

Pissing Stars é o segundo álbum a solo de Efrim Manuel Menuck, um dos fundadores das bandas Godspeed You! Black Emperor e Thee Silver Mt. Zion Memorial Orchestra. O disco é inspirado pelo breve romance entre a apresentadora de televisão americana Mary Hart e Mohammed Khashoggi, filho de um traficante de armas saudita. É um álbum com momentos ruidosos e longos drones onde é criada uma atmosfera sombria, mas não tão poderosa e cinemática como nos trabalhos de GY!BE. Uma música que tenta criar uma paisagem sonora assim é “Black Flags Ov Thee Holy Sonne”, que integra um simples drone complementado por outros sons, alguns adequados e bem utilizados, mas sem nunca se tornar especialmente interessante. Na mesma faixa, o uso da voz de uma criança parece algo forçado e os aspetos mais lo-fi da gravação e produção não a beneficiam. 
Drones e repetições encontram-se em várias músicas e nem sempre funcionam. Os loops de bateria presentes em “The State and Its Love and Genoicide” e “A Lamb in the Land of Payday Loans”, por exemplo, não são interessantes nem agradáveis. A segunda destas faixas merece ser realçada pela sua diferença em relação às outras, pois é uma música mais rock e convencional, mas não é boa nem se enquadra bem entre as outras. Não deixamos de encontrar aqui alguns momentos mais atmosféricos e eficazes, como no curto interlúdio “Kills v. Lies”, na segunda parte de “LxOxVx / Shelter in Place”, onde a música se transforma e fica mais intensa, com novos sons a sobreporem-se ao drone inicial, e em “Pissing Stars”, um bom fecho.
Pissing Stars não é tão assombroso ou melancólico como poderia ser com um maior desenvolvimento da sua sonoridade, mas também não é um mau disco. É razoável. Algumas músicas resultam, outras perdem a minha atenção rapidamente, deixando-me, no geral, (quase) indiferente. Quem for fã do artista ou do pós-rock mais sombrio e repetitivo pode encontrar aqui algo do seu agrado, enquanto quem não o for, na pior das hipóteses, fica com uma nova dose de música de fundo pouco intrusiva para atividades da sua preferência.
Rui Santos



All At Once // Don Giovanni Records // fevereiro de 2018
8.3/10

Originários de New Brunswick, em Nova Jérsia, a banda de indie/punk-rock Screaming Females lança o seu sétimo álbum, All at Once, pela editora Don Giovanni Records, onde já são prata da casa. Em jeito de revisão da matéria dada, espere-se mais uma dose de hinos sobre fúria pura e dura e auto-afirmação, em forma de vocais crus – cortesia da vocalista Marissa Paternoster – e de um poderio instrumental natural e abrasador, largamente influenciado pelo espírito D.I.Y do movimento original do indie-rock, que marcou presença em larga escala no panorama musical dos anos 80. 
Enquanto que a garra de álbuns anteriores, cuja sonoridade fica a dever bastante à influência de bandas como Sleather-Kinney e Dinosaur Jr., se mantém inalterada, a musicalidade evoluiu significativamente do ponto de vista do songwriting e da habilidade instrumental, com riffs igualmente musculados e destemidos, uma dinâmica rítmica que só enfatiza a vivacidade sonora do grupo, solos cheios de melodia e maiores que a vida, e um feeling geral bastante catchy, como aliás se reflete ao longo das quinze faixas que compõem este álbum. Músicas como “Black Moon”, “I’ll Make You Sorry”, “End of My Bloodline” e “Fantasy Lens” são um óptimo cartão de visita para All at Once, que demonstra uns Screaming Females em topo de forma.
Ruben Leite



Hormone Lemonade // Duophonic Records // março de 2018
8.0/10


É raro termos um encontro refrescante e autêntico com um sabor antigo – quando voltamos a um género que tem idade para ser nosso pai, há sempre alguma tendência em causar no paladar uma sensação de algo que, mais do que nostálgico, se torna rapidamente previsível. Como antítese disso, surgem os alemães Cavern of Anti-Matter, um trio de krautrock que se dedica a inovar sobre um género que podia facilmente ter estagnado nos anos 70. Com uma facilidade demasiado natural – talvez proveniente do fato de parte do trio ser composto por artistas que já tocaram com Stereolab – conseguem criar uma série de paisagens que colocam em perfeita harmonia as sonoridades veteranas da música progressiva electrónica – com óbvio destaque para a escola de Berlim – com synth-pop moderno e contagiante. Hormone Lemonade é o último testemunho disso, editado dia 23 de março de 2018, com ritmos e melodias orelhudas assentadas sobre o caleidoscópio psicadélico e instrumental do trio berlinense. Numa altura em que a reinvenção e o reaproveitamento representam as derradeiras formas de arte, os Cavern of Anti-Matter representam um bom exemplo de como convergir velhas diretrizes com novos rumos e Hormone Lemonade é o seu último manifesto.

José G. Almeida








The Nothing They Need // Xemu Records // março de 2018 

7.0/10


“Open the door, open the way, open the gate”… 
Assim começa The Nothing They Need, o mais recente trabalho dos Dead Meadow. E “Keep Your Head” – o primeiro tema do disco – faz-nos viajar pelas planícies do psych, compostas por auto-estradas com enormes rectas que atravessam aquele deserto que vive no nosso imaginário coletivo. O mesmo deserto que nos imaginamos a percorrer ao volante de um potente muscle car enquanto roda um bom disco e um bom charro. Depois dessa viagem, o disco desenrola-se em momentos menos derivativos tais como “I’m so Glad”, um tema bluesy com grande potencial para figurar num western, e a incursão nos domínios do doom que ouvimos em “The Light”. 
O meu destaque vai para “Nobody Home”, faixa que funde os blues com o lado mais delirante e introspectivo dos Dead Meadow. O ponto de fusão desse cocktail dá-se por volta dos 3’15”, quando a instrumentação privilegia a presença vocal de Simon, um ser absorto na sua solidão e em pleno exercício de contemplação da ruína de uma casa. Esta faixa fez-me imediatamente lembrar aquela mítica cena final do Zabriskie Point (Fun fact: os Pink Floyd também têm um tema chamado “Nobody Home”). 
20 anos passaram desde a formação dos Dead Meadow. E para o bem e para o mal, eles continuam iguais a si próprios. The Nothing They Need, o disco que marca as duas décadas de existência da banda, não soa a fresco. Se querem ouvir algo inédito, vão ter que procurar outro oásis. Mas se o que buscam é companhia para atravessar o deserto, os Dead Meadow continuam a ser os vossos manos.

Eduardo Silva








Jukebox Babe / No Fun // Sacred Bones // janeiro de 2018
8.0/10


Quase um ano após o lançamento do seu primeiro disco de 2017, Occult Architecture Vol. 1, os Moon Duo regressam aos lançamentos, desta vez com uma abordagem bastante diferente da habitual. 
Depois de seis álbuns de originais aventuraram-se numa reinterpretação de dois temas clássicos, “Jukebox Babe” de Alan Vega e “No Fun” dos The Stooges. Em ambas as canções foi reduzida a velocidade, comparando à versão original, e a importância dos vocais foi trocada com a dos instrumentais, passando a haver um foco muito maior em todos os ciclos de repetição, também a extensão das canções foi aumentada. Deste modo tornaram-se semelhantes a algo que os Moon Duo poderiam ter feito de raiz. “Jukebox Babe” e “No Fun” são duas reinterpretações às quais qualquer fã das originais ou da banda deve dar pelo menos uma oportunidade.

Francisco Ávila


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