Cinco Discos, Cinco Críticas #37

| Junho 3, 2018 4:50 pm


Com o sexto mês do ano em voga chega igualmente aquela fase de fazer um apanhado das melhores edições que foram saindo durante os meses transatos. Antes disso, sai mais uma edição do Cinco Discos, Cinco Críticas onde opinamos sobre os mais recentes lançamentos de Thou – The House Primordial (Robotic Empire); Harmony In Grotesque – Noumenon (826726 Records DK2); Boss Keloid Melted on the Inch (Holy Roar Records); Playboi Carti Die Lit (AWGE Label) e The Garden – Mirror Might Steal Your Charm (Epitaph Records). Podem ouvir estes discos e ler os respetivos pontos de vista, abaixo.


The House Primordial // Robotic Empire // maio de 2018 

8.5/10 


Os Thou são uma das bandas mais prolíficas e interessantes do panorama do sludge e da música extrema em geral. E depois de um intervalo de três anos, eis que surge The House Primordial, o primeiro EP de uma série de três que antecedem Magus, o seu primeiro LP desde Heathen, o qual tem data de lançamento prevista para final de agosto deste ano. 
The House Primordial é um EP brilhante, porque consegue condensar numa timeline relativamente curta – mais ou menos 37 minutos – uma amostra refinada daquilo que é a essência dos Thou: uma banda capaz de criar atmosferas e não somente debitar barulho. É certo que se apreciarmos o disco faixa a faixa, constatamos que a partir da “Diaphonous Shift” em diante é uma descarga cacofónica da instrumentação: uma parede sonora permeada pela deprimente lírica – gritada por Brian Funck – com o desígnio de nos angustiar no melhor dos sentidos. Mas ao ouvirmos o disco do início, com o drone de “Wisdom in the Open Air” a terminar em “Premonition” – a primeira música com vocals do EP – uma faixa que é um autêntico vaivém de ansiedade, na qual estamos sempre à espera da explosão que nunca chegará. Em vez disso, entramos directamente em “The Sword Without a Hilt”, na qual as guitarras saídas do bayou nos transmitem aquela sensação de calma antes da derradeira tempestade. E é nesta etapa que os Thou vos avisam que este EP foi feito para vos castigar e às vossas colunas. Avancem por vossa conta e risco mas estejas conscientes disto: os campeões voltaram e continuam implacáveis.


Edu Silva




Noumenon // 826726 Records DK2 // abril de 2018 

7.0/10 

Ativos desde 1998, os russos Harmony In Grotesque já não são novatos na cena do chamado dark metal, subgénero que normalmente envolve influências de death, black e doom metal. O seu terceiro disco Noumenon sucede a Painted by Pain lançado em 2003 e, tal como este, utiliza elementos maioritariamente de death e doom metal, juntamente com vários twists da sua fórmula avant-garde
Dos sete temas que compõem o álbum, as thrashy “Infected” e “Stepentatio” são as peças mais fortes, estando repletas de mudanças de ritmo e riffs jazzy e aproximando-se até da vertente técnica do death metal aperfeiçoada por bandas como os Atheist e Cynic. “Noumenon”, “The Funeral Song” e “…And Sorrow Will Be My Wings” são os temas mais doom e contêm traços de grupos como os Draconian e My Dying Bride, enquanto “Painted by Pain” se destaca pelo seu uso de saxofone que deixaria o alemão Peter Brötzmann orgulhoso. Os elementos avant-garde acabam por ser o ponto mais atraente do disco, embora a sua inserção seja algo desconexa em certas ocasiões e ficando a sensação de que deveriam ser utilizados mais como a base da composição e não apenas como um floreado adicional. O disco também beneficiaria de uma produção mais polida, principalmente a nível dos vocais e com as guitarras a sobreporem-se aos restantes instrumentos em vários momentos. Ainda assim, Noumenon demonstra que o grupo continua a progredir e seria interessante que se deixasse envolver completamente pelos seus devaneios experimentais.

João Barata




Melted on the Inch // Holy Roar Records // abril de 2018

7.8/10

Vindos de Wigan, no Reino Unido, os Boss Keloid têm andado desde 2010 a reunir mais e mais atenção devido ao contínuo aprimoramento do seu estilo de música pesada que faz experimentalismos com os riffs vagarosos do sludge/doom metal, passagens breves pelo lado psicadélico e os compassos compostos dinâmicos do metal progressivo. 
Enquanto que comparações com bandas veteranas como os Mastodon e os Baroness sejam talvez inevitáveis, os britânicos apresentam argumentos suficientes para não serem confundidos com as mesmas no seu mais recente álbum, Melted on the Inch. Neste disco, a banda toma ainda mais liberdades em termos de pôr à prova a sua habilidade técnica, brincando com texturas sonoras mais aveludadas, dinâmicas loud vs. quiet e até mesmo com introduções pseudo-reggae que não têm direito nenhum de funcionar, mas que funcionam em pleno. Para aqueles que preferem a sua música pesada com requintes de espírito aventureiro, este é um disco que se destaca dos demais lançados dentro do género sludge/stoner devido a essa qualidade.

Rúben Leite




Die Lit // AWGE Label // maio de 2018 

4.8/10 

Jordan Terrell Carter é o nome por detrás de Playboi Carti, o mumble rapper americano que entrou nas bocas do mundo com a sua mixtape homónima de estreia, onde contem o seu single mais conhecido “Magnolia”. Produzido por Pi’erre Bourne na sua maioria, Die Lit apresenta-se aqui como o álbum de estreia do Carti. Um registo que conta com faixas de colaborações ilustres como Travis Scott, Lil Uzi Vert, Skepta, Young Thug, entre muitos outros. 
Antes sequer de ouvirmos Die Lit, reparamos logo que este álbum segue a mesma estratégia comercial que alguns mumble rappers americanos têm apresentado nos últimos tempos. Uma tracklist demasiado extensa, feita de propósito para os álbuns chegarem rapidamente aos certificados de ouro e platina, pois as regras da RIAA (Recording Industry Association of America) ditam que por cada 1500 audições de uma música individual conta como a venda de um álbum inteiro. Isto serve para aumentar a popularidade dos artistas, passando mais vezes nos tops das rádios etc… o que pode não ser um problema, mas aqui acaba por ser. Quando começamos a ouvir Die Lit ficamos instantaneamente viciados na batida do Carti, mas à medida que as músicas vão avançando o aborrecimento toma conta da nossa mente. 19 músicas com beat semelhante à “Magnolia” é simplesmente demais. As nuances musicais na tracklist são muito poucas, mesmo num estilo menos abrangente como o mumble rap. O mesmo baixo distorcido, com o mesmo ritmo, hi-hat e snare por trás é a melhor descrição para mais de metade do álbum. Ainda assim há músicas que se destacam pela positiva, as que podemos considerar o núcleo duro de Die Lit. “R.I.P.”, “Lean 4 Real” (feat. Skepta) e “Poke It Out” (feat. Nicki Minaj) são alguns dos destaques neste álbum que não contem muitos pontos altos, devido ao que foi dito acima. Se o Carti tivesse feito este álbum mais curto se calhar a minha opinião seria diferente, mas por favor mumble rappers, não façam álbuns com 20 músicas.

Tiago Farinha


Mirror Might Steal Your Charm // Epitaph Records // março de 2018 


8.5/10 


The Garden são um duo de irmãos gémeos americanos com uma sonoridade bastante característica que passa por vários géneros musicais. A variedade de influências e estilos das suas músicas está muito presente neste seu novo álbum, Mirror Might Steal Your Charm. Há linhas de baixo post-punk, músicas que misturam o rock com diversos sons inesperados, influências de hip hop, rap, spoken word, EDM, punk e não só. São feitas muitas experiências que demonstram a qualidade, criatividade e humor da banda e que resultam mesmo quando as misturas são mais surpreendentes. No entanto, não deixa de ser um disco coerente, porque todos os elementos usados destes estilos musicais são filtrados e misturados pela banda. 
“Stallion” abre o álbum com energia punk e um baixo poderoso, músicas como “Shameless Shadow” e “:(” demonstram a variedade de sons de teclados que são usados nestas faixas, incluindo, na segunda, uma variedade de samples de baixa qualidade muito engraçados que estão integrados em alguns teclados Yamaha. “A Message for Myself” é uma espécie de hip hop experimental com percussão frenética que podia funcionar em músicas de géneros como drum and bass, enquanto que “Call the Dogs Out”, atualmente a minha preferida, tem melodias de baixo e voz muito bonitas que criam um som mais relaxado na que é uma das faixas mais pop do álbum, em conjunto com “No Destination”. 
Mirror Might Steal Your Charm é possivelmente o melhor trabalho dos The Garden até agora. Um disco que é constantemente original, imprevisível, interessante e divertido.


Rui Santos





FacebookTwitter