Cinco Discos, Cinco Críticas #38

| Julho 1, 2018 3:33 pm
A finalizar o primeiro semestre do ano destaque para as edições dos ingleses LUMER – com Blood On Suits (Hidden Bay Records); dos norte-americanos sewingneedle – com use error (Aerial Ballet Records); dos holandeses Geomatic – com a reedição de Control Agents (m-tronic, 2018); do português Serpente com Rituais 101 (Tormenta Eléctrica) e ainda o projeto do italiano Paolo MontiThe Star Pillow, com Symphony for an Intergalactic Brotherhood (Boring Machines). As opiniões a estes cinco registos, podem ler-se abaixo em mais na 38ª edição do Cinco Discos, Cinco Críticas.


Blood On Suits // Hidden Bay Records // junho de 2018 

8.5/10 

Se o post-punk é a vossa vida então têm mesmo de ouvir o novo EP dos ingleses LUMER, quarteto que já anda por aí desde 2016, data em que lançaram o seu EP de estreia, homónimo, pela Warren Records. Agora na casa Hidden Bay Records, em formato cassete, os LUMER trazem mais quatro temas abrasivos que preparam o ouvinte para gastar toda a sua energia. Os LUMER até podem ser novos no panorama, mas a julgar pelos dois EP’s que já lançaram – essencialmente este último – podemos claramente afirmar que este quarteto é um dos nomes que vai marcar a próxima onda do post-punk contemporâneo. Neste Blood On Suits EP a banda vai repescar as sonoridades do shoegaze, do kraut-rock e os ritmos do punk, apresentando uma sonoridade à qual é impossível não sentir imersão instantânea. 
A abrir com “Ours is Treason” a banda de Hull mostra que as raízes do punk/post-punk estão na base do seu trabalho, continuando nesse registo em “Distante Relative”, onde podemos também ouvir um trago de noise-rock e a voz de Alex Evans rasgada de emoção e revolta. Ainda naquelas malhas que têm mesmo de ouvir está o single que serviu de apresentação a este novo EP, “Burn/Bleed”, que recebe uma transformação muito linda perto dos dois minutos de avanço. O mais interessante nos LUMER é a sua abordagem muito singular – apesar de notarmos as suas influências, o resultado sonoro deste Blood On Suits é bastante único. Post-punk genuíno e do bom, pronto para invadir os tops do ano.
Sónia Felizardo


user error // Aerial Ballet Records // maio de 2018 

7.4/10 

Originais de Chicago, os sewingneedle lançam o seu segundo álbum, user error, assumindo-se como uma banda apologista da era alternativa musical dos anos 80 e 90, para o bem e o para o mal. Com isso quer-se dizer que a sonoridade destes rapazes retira imensas influências de géneros como o post-hardcore, o grunge e o post-punk, resultando numa investida sonora – que cruza trabalho rítmico complexo e guitarras ora sujas, ora melódicas, com letras meio negativistas e abstratas sobre assuntos pessoais e outros assuntos da praxe – exibida ao longo de nove canções que fazem lembrar bandas como os Slint, os Fugazi ou até mesmo Sonic Youth. Nada de extraordinariamente original, portanto. 
Porém, é óbvio desde o início que os sewingneedle não pretendem reinventar a roda, preferindo apenas mandar rock raivoso, dissonante e direto ao assunto e, acreditem que estes meninos conseguem fazer isso e ir um pouco mais além com ideias próprias interessantes. Quanto ao álbum user error em si, é uma prova sólida de que a banda consegue saciar aqueles que procuram um som mais reminiscente daqueles anos vindouros em que a raiva mais contida e taciturna em formato sonoro era rainha e senhora, como notado nos cânticos angustiados do tema homónimo, na vibe pessimista do single “feel good music”, na performance mais pulsante na forma de “buddy” e no tema final do alinhamento, com um encanto lento e abatido por sinal, de seu nome “credits”.
Ruben Leite



Control Agents // m-tronic // abril de 2018 

8.0/10 

Control Agents é o disco de estreia da dupla holandesa Geomatic – lançado originalmente em 2001 pela Triumvirate – ‎e que recebe, dezassete anos depois, uma nova reimpressão pelo selo francês m-tronic, a 25 de abril de 2018. A dupla, formada em Amesterdão em 1995 e composta por Andrei Vasiljev e Serge Marinec, conta até à data com quatro discos de estúdio e uma intensa capacidade criativa na exploração de ambientes obscuros e industriais, que se refletem na sua discografia de carácter tecnicamente futurista. Caracterizado por um desenvolvimento essencialmente moroso, Control Agents é um disco que não atinge qualquer ouvido, esta é música psicologicamente densa que consegue orientar o ouvinte a um estado mental explorativo, mas que ao nível físico não se repercute pela ausência de ritmos monótonos ou marcados. Este disco retrata na perfeição as novas abordagens da música eletrónica experimental na atualidade, mas com a importância especial de terem sido escritas e composta em 2001, elevando assim o potencial estético e visionário que os Geomatic têm envolto. Control Agents é uma obra digna de audição por qualquer melómano da música eletrónica experimental / industrial / minimal. 

A m-tronic está a disponibilizar para download gratuito este Control Agents, bastando para isso aceder a este link aqui. Esta reedição vem anteceder o quinto álbum de estúdio dos Geomatic, Transcommunication, que é esperado chegar às prateleiras no Inverno.
Sónia Felizardo



Rituais 101 // Tormenta Eléctrica // junho 2018 

8.5/10 

Serpente, Ondness, Sabre ou até mesmo Osso são muitos dos nomes que o compositor e músico Bruno Silva tem utilizado ao longo dos anos enquanto produtor dos mais variados géneros de música situada no espectro do techno underground lisboeta. Quem acompanha o artista sabe o que lhe espera, um espetáculo sonoro que é capaz de causar despertares inilidíveis a nível auditivo e, pode observá-lo, logo desde os cedos trabalhos até ao EP que hoje vamos abordar: Rituais 101, lançado pela Tormenta Eléctrica neste mês de junho, um EP que merece especial atenção pela curta duração mas longa recordação que deixa nos nossos ouvidos. 
Organizado em A Side e B Side, ambos com duas faixas, Rituais 101 é um desafio para a atenção dos mais desatentos e para a audição de qualquer um que “perca” tempo a ouvir, começando logo com a faixa “Sangue de Galo” que nos apresenta uma raiz de break techno, muito sampling e um estudo meticuloso de vários géneros que irão culminar na faixa, num beat forte e potente. Esta é uma faixa introdutória forte, que nos leva a tentar pelo menos perceber o caminho a que conduz o restante EP. Relevância e menção também para “Venda de Altar”, talvez a faixa de digestão mais fácil, fazendo lembrar Autechre ou mesmo Richard D. James pela perícia de Serpente no mixing e sampling de tracks. Finalmente, falar de “Fio Obeah” faixa que alia o techno ao dub, criando uma harmonia perfeita e uma faixa excelente. Um disco que merece ser escutado com atenção e que merece ser digerido com cuidado, não fosse esta a serpente mais perigosa que poderá andar pelas ruas do techno underground lisboeta.
Duarte Fortuna



Symphony For Intergalactic Brotherhood // Boring Machines // março de 2018 

8.0/10 

Symphony for an Intergalactic Brotherhood é o mais recente disco do projeto The Star Pillow, que nasceu em 2007 pelas mãos do guitarrista italiano Paolo Monti. Especializado nos campos da música drone-ambient, as texturas exploradas neste disco – com uma duração aproximada a quarenta minutos – apresentam uma série envolvente pelos campos da improvisação, dividida em três partes. O disco foi gravado e composto por Paolo Monti em formato DIY e apresenta um total de três músicas que dividem o álbum entre introdução, desenvolvimento e conclusão, sendo mais uma edição de qualidade do selo italiano Boring Machines
No primeiro tema, “My Dear Elohim”, Paolo Monti começa por introduzir ao ouvinte o seu conceito de desenvolvimento arrastado expressando-se num ritmo que, progressivamente, vai adquirindo uma tonalidade mais negra, profunda e igualmente grandiosa. Já em “An Interstellar Handshake” podemos ouvir as suas influências mais clássicas e entrar num estado quase de nirvana, pelo relaxamento estático que o tema proporciona entre corpo e mente. A encerrar, com “From Dust to Stars”, Paolo Monti consegue purgar todas as nossas más energias fazendo deste Symphony for an Intergalactic Brotherhood, não apenas um álbum, mas uma completa terapia. 
Sónia Felizardo



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