Cinco Discos, Cinco Críticas #42

| Dezembro 4, 2018 10:16 pm


Na última edição do ano do Cinco Discos, Cinco Críticas fazemos uma pequena retrospetiva de alguns trabalhos que sairam ao longo do ano e aos quais demos alguma atenção. Falamos de Cease The Day, o novo disco dos In The Woods…; Queen of Golden Dogs, a mais recente edição de VesselAnother Shape of Psychadelic Music o disco que serviu de apresentação aos Mythic Sunship na passagem por Portugal; XI e XII as mais recentes edições do projeto de 18 narrativas de Vlimmer e, por fim, Blue Poles, o novo trabalho de Jack Ladder & The Dreamlanders.

As opiniões sobre os respetivos trabalhos podem ler-se abaixo.


Cease The Day // Debemur Morti Productions // novembro de 2018 

6.7/10 

Depois da inesperada reunião em 2014 e do lançamento de um novo álbum, os In The Woods… estiveram novamente perto de implodir com a saída dos membros fundadores Christopher e Christian Botteri no final de 2016. Ainda assim, o baterista Anders Kobro e o novo vocalista James Foggarty não desistiram e, com a ajuda de Bernt Sørensen e Kåre Sletteberg, voltam a tentar renascer das cinzas com Cease The Day. Com composições mais inspiradas e dinâmicas que as de Pure, Cease The Day mostra também uma maior aposta em vocais ríspidos e elementos típicos de black metal, fugindo à atmosfera quase inteiramente prog doom do seu antecessor, mas sem regressar à veia psicadélica e avant-garde de Omnio ou Strange In Stereo. O disco inicia-se com “Empty Streets”, onde James Foggarty demonstra a versatilidade dos seus vocais e com uma atmosfera menos melancólica do que seria de esperar da banda, sendo facilmente comparável aos trabalhos mais recentes dos também noruegueses Enslaved ou Borknagar. Seguem-se a mais extrema “Substance Vortex” e a memorável “Respect My Solitude”, com influências dos Swallow the Sun. Contudo, o álbum perde fulgor nos restantes temas ao deambular exageradamente em certas passagens e pela tentativa de englobar demasiadas ideias, que acabam por não ser devidamente exploradas ou não se enquadrarem. Em suma, Cease The Day demonstra que os In The Woods… têm capacidade para não viver à custa do passado mas peca pela sua inconsistência.
João Barata






Queen of Golden Dogs // Triangle Records // novembro de 2018


8.5/10


Os últimos anos têm vindo a verificar um aparente rejuvenescimento por parte da norte-americana Triangle Records. A editora que em tempos nos trouxe trabalhos de Balam Acab, Lotic e The Haxan Cloak aposta agora numa direção algo diferente do habitual, mas que se destaca pelo seu carácter subversivo e emergente (é o caso de Serpentwithfeet), mas também através de uma constante redefinição por parte dos nomes que integram o catálogo da editora desde a sua génese. O produtor britânico Serge Gainsborough enquadra-se na última categoria. Queen of Golden Dogs, o mais recente longa-duração de Gainsborough como Vessel, marca um novo capítulo na carreira do natural de Bristol. Depois da rave industrial de Order of Noise (2012) e do tormento psicológico de Punish, Honey (2014), Gainsborough reinventa-se com um exercício contemporâneo que desafia as leis do maximalismo. Complementando a força bruta das batidas descontruídas com a delicadeza dos arranjos de câmara, o produtor cruza clássico e moderno de modo magistral, onde coros e secções de cordas se juntam a texturas de uma eletrónica sem rótulos. O resultado é uma obra de proporções barrocas pelos terrenos da música de dança mais versátil e fora da caixa, materializada através das composições cortantes de “Argo (For Maggie)”, o cantar quase-gregoriano de “Torno-me eles e nau-e (For Remedios)” (uma ode ao poema “Não sei quantas almas tenho”, de Fernando Pessoa) ou a natureza eufórica de “Paplu (Love That Moves The Sun)”. Produzido durante um período de dezoito meses nos campos verdejantes do País de Gales, Queen of Golden Dogs representa a quintissência de Gainsborough como artesão sonoro, fazendo deste o seu melhor registo até à data.

Filipe Costa








Another Shape of Psychadelic Music // El Paraiso // outubro de 2018


8.0/10


Uma das viagens mais conturbadas deste ano fez-se ao som dos dinamarqueses Mythic Sunship, cujo incrível nome deriva da amalgama de duas obras-primas do Jazz: o Of Mythic Worlds de Sun Ra e Sun Ship de John Coltrane. Another Shape of Psychadelic Music é não só o quarto album da banda e o segundo que estes lançaram em 2018, como também é o mais ambicioso do quarteto composto por Rasmus Christensen (baixo), Fredrick Denning (bateria), Emil Thorenfeldt (guitarra) e Kasper Anderson (guitarra). Com a ajuda de Jonas Munk (guitarrista de Causa Sui) na produção, e a contribuir também na guitarra na segunda e quinta faixa “Backyard Ritual” e “Out There”, respetivamente, e Soren Skov que contribui no saxofone ao longo do álbum. O conjunto de músicos propõe-se a levar a música psicadélica onde esta nunca foi antes, com uma mistura free jazz com space rock que convidam o ouvinte a passear por diversas paisagens inesperadas onde a improvisação da banda faz com que nunca saibam o que está ao virar da esquina. A primeira faixa, “Resolution”, que abre com um solo de saxofone e umas discretas linhas de baixo, marca a identidade e deixa a fasquia definida para as restantes músicas. Um crescendo que resulta numa cacofonia caótica de sons e texturas que promete deixar o recetor num autêntico estado de êxtase. 
Apesar de achar este álbum incrível, compreendo que não é algo para todas as audiências, muitos podem não estar com paciência para se entregarem ao desenrolar da construção dos instrumentais, podem achar que ao longo do álbum exista pouca diversidade e por vezes caia um pouco na repetição. Contudo, se se entregarem de abraços abertos, Another Shape of Psychadelic Music promete ser uma experiência inesperada repleta de caos controlado por habilidosos artífices musicalmente completos. Um lançamento que irá deixar uma marca para as futuras bandas que tentarem replicar este género de rock psicadélico instrumental.

Hugo Geada






XI/XII // Blackjack Illuminist Records // novembro de 2018


7.0/10



Vlimmer, o projeto a solo de Alexander Leonard Donat (que é como diz o big boss da Blackjack Illuminist Records, além do mentor de outra mão cheia de projetos), voltou a lançar este ano mais dois trabalhos curta duração, XI e XII, integrados no seu objetivo de lançar um capítulo de narrativas composto por 18 EP’s, iniciado em 2015. Através de um total de 10 canções, que aborda ritmos ora calmos e dentro das ondas ambiente (como “Wärm”), ora tempestivos e de tonalidades mais vívidas (como por exemplo “Leben”, “Lösung”, “Asphaltdecke” ou “Farblosigkeit”), ora sinistros e de desenvolvimento tenso (como é o caso de “Licht” ou “Regen”) Vlimmer segue consistentemente a sua paixão pelas sonoridades mais negras já trabalhadas no antecessor X. Com caixas de ritmos e sintetizadores a fazer lembrar os saudosos anos 80, Vlimmer cria a sua própria parede atmosférica onde conjuga uma infâmia de géneros, em canções essencialmente nostálgicas e de aura dançante. Se em XI vemos um Vlimmer mais nos campos da synthpop, em XII conseguimos reconhecer um produtor com uma veia mais industrial, de desenvolvimento poderoso e de ritmos a trazerem à memória nomes como Perturbator, Iceage ou The Soft Moon, numa melodia claramente alemã. Estes novos XI e XII (editados numa edição conjunta em CD dentro de uma caixa de madeira e limitados a 30 cópias) refletem o preciosismo e a criatividade musical excêntrica que circunda o ambiente de Alexander Leonard Donat, afirmando-o cada vez mais como um dos mais multifacetados artistas do panorama atual. Vale a pena ouvir.

Sónia Felizardo






Blue Poles // Interscope Records // maio 2018 


6.0/10 


Jack Ladder, sendo um artista australiano da mesma “escola” de Alex Cameron, Kirin J Callinan e Donny Benét, fazendo parte da sua banda The Dreamlanders os dois últimos, é autor de um dos discos que eu mais esperava em 2018 assim como um dos que mais me desiludiu. O lançamento do single “White Flag”, que na minha opinião remanece um dos melhores singles de 2018, cimentou todo o meu hype para este disco. Após uma primeira audição do álbum não consegui destacar nenhuma canção para além da que já conhecia, coloquei o álbum, outra vez, na lista de “para ouvir” e aí ficou até há umas semanas. Voltando a ouvir o disco com mais tempo e atenção gostei de alguns outros temas (acredito que seria um EP excelente só com “Susan”, “White Flag”, “Feel Brand New” e “Merciful Reply”) e como pontos positivos tem de ser de ser destacada a voz grave de Jack, alguns refrões catchy (ainda que não o suficiente para o ser à primeira) e a vibe Alex Cameron ainda que numa versão muito mais sóbria. Em suma, Blue Poles é um disco que, na minha opinião e infelizmente, se perde por ter um single demasiado bom.

Francisco Ávila




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