Os melhores álbuns nacionais de 2018

| Dezembro 30, 2018 9:24 pm

Em 2018 a matriz do talento nacional não sofreu mutações significativas e a receita continua a ser a mesma dos anos anteriores: ecletismo musical. Fomos brindados com a experimentalidade ritualística dos HHY & The Macumbas, o hip-hop nortenho e jocoso do Conjunto Corona, a portugalidade e o romantismo contemporâneo embebidos nos beats de David Bruno, o minimalismo melancólico de Francisco Oliveira e as baladas insulares de MEDEIROS/LUCAS. Fiquem a conhecer os 30 melhores álbuns nacionais que se destacaram este ano.

30- Beautify Junkyards The Invisible World of Beautify Junkyards

29- Buhnnun buhnnun

28- Cave Story Punk Academics

27- RS Produções – Bagdad Style

26- Quadra Cacau




25- dreamweapon SOL




24- NERVE Auto-sabotagem

23- Linda Martini Linda Martini

22- Joana Gama e Luís Fernandes At The Still Point Of The Turning World

21- Colónia Calúnia [caixa]

20- Momentum IIImpatience door

19- Astrodome II

18- Baleia Baleia Baleia Baleia Baleia Baleia

17- Filipe Sambado Filipe Sambado & Os Acompanhantes de Luxo

16- ZGAXDEL Directrizes e Métodos de Transcendência

15- P. Adrix Álbum desconhecido

14- João Pais Filipe João Pais Filipe

13- UNITEDSTATESOF Selections 0

12- indignu umbra

11- Iguanas Lua Cheia

10- Norberto Lobo Estrela

9- Niagara Apologia

8- FERE Montedor

7- FARWARMTH IMMEASURABLE HEAVEN



6- Filho da Mãe Água-Má

5- MEDEIROS/LUCAS Sol de Março

MEDEIROS/LUCAS são uma dupla formada por Pedro Lucas (Lisboa)
e Carlos Medeiros (São Miguel) e com o disco Sol de Março deram fim à trilogia
iniciada com Mar Aberto (2015) e Terra do Corpo (2016). O álbum lançado em
março pela Lovers & Lollypops é composto por doze canções que abordam a
parte da razão e do pensamento e brincam com as relações entre a luz e a
sombra, mantendo o habitual tom melancólico e de balada em temas como
“Podre Poder” e “Elena Poena”. Neste novo trabalho os
caminhos fazem-se conduzidos pela voz de Medeiros que nos mostra agora novas
facetas, com melodias mais vincadas e com maior alcance. As canções essas,
continuam a ser escritas sobretudo por Pedro Lucas, a partir das letras do
escritor açoriano João Pedro Porto, explorando ao mesmo tempo um novo
território sonoro, do blues ao jazz e à eletrónica. 
4- Francisco Oliveira On the Act of Reminding

A pegada musical do artista pluridiscplinar Francisco Oliveira espalha-se por projetos como Deepbreathers, Terebentina ou Holoscene 85′, mas também sob uma vertente mais íntima e pessoal que explorou pela primeira vez, este ano, em nome próprio. On the Act Of Reminding, o primeiro registo de Francisco sob este novo formato, vê o músico e produtor sediado no Porto enveredar pelos caminhos de um minimalismo puro e bucólico. Em jeito de carta de amor, Francisco explora as potencialidades do tempo e da memória, sua e dos seus antepassados. Foi, aliás, no piano de casa de sua avó que o músico construiu cuidadosamente as cinco peças que compõe este trabalho, apropriando-se do estado de uso e desuso do instrumento para uma obra despojada e visceral que tem tanto de cru quanto de delicado.
3- David Bruno O Último Tango em Mafamude

Vila Nova de Gaia é a temática de estudo deste novo álbum de David Bruno, mais conhecido por estas andanças por dB, membro integrante do Conjunto Corona. O Último Tango em Mafamude, lançado pela 1980, sucede então a 4400 OG de 2016, sendo um álbum mais acutilante que se dedica a contar o amor não correspondido pelo artista à sua cidade Vila Nova de Gaia. 

Um álbum com cheiro a “Novycera” ou aquele Alfa Romeu Julietta, tema da primeira canção, daquele tio ou avô de amigo que usa cuidadosamente desde a sua compra nos anos 70 ou 80 quiçá. É mesmo isso que David Bruno pretende, mostrar através também de vídeo o bom ou o que fica dos anos 90. Carros com design que actualmente estão “out” em termos de “fashionismo”, anúncios televisivos com cores berrantes, restaurantes ou “snack-bars” icónicos de Gaia, que poderiam ser da cidade de qualquer um dos ouvintes. 

Este trabalho explora as mais diversas sonoridades, do soul e R&B ao psych rock e early hip hop, acompanhados por vezes de uma guitarra vibrante. Não esquecer também Marante, inspiração para a capa e para a mística do álbum e Toy, famoso e prodigioso cantor de baladas de amor. É mesmo esse hook “Romântico como o Marante, apaixonado como o Toy”, que faz a música “Amor Anónimo”, a par da forte guitarra eléctrica como nos filmes eróticos do antigamente.

2- Conjunto Corona Santa Rita Lifestyle

Fazer um álbum sobre a religião das bombas de gasolina e receber uma aclamação positiva geral por parte da crítica e dos fãs é uma obra incrível. Logos e dB (que não se dá por satisfeito ao participar em apenas um dos melhores álbuns do ano) escreveram mais um capítulo na conturbada vida de Corona, que depois do falhanço do negócio de Cima de Vila Velvet decide virar-se para a religião e a espiritualidade.

Santa Rita Lifestyle trás algumas mudanças neste novo álbum, nomeadamente músicas mais curtas e com menos letras, contudo a identidade e espírito permanecem intactos com a referência a inúmeros regionalismos da zona do Porto, Gaia e arredores e com a utilização de samples tão inacreditáveis que nos deixam a pensar se o David Bruno não deveria passar menos tempo na internet e ir passear para um sítio verde enquanto refresca os pulmões com um pouco de ar puro.

As músicas continuam icónicas e memoráveis, de salientar a faixa que partilha nome com o álbum, “Eu Não Bebo Cola Cola eu Snifo”, “Perdido na Variante” com a contribuição do incomparável PZ e “Dali Somali”, pessoalmente, a que tem a melhor sample e que dá uma enorme vontade de encher umas flexões na pista do Rock’s.
1- HHY & The Macumbas Beheaded Totem

Há álbuns que nos fazem questionar a própria definição de jazz. Outros, aquilo que é esse chavão distante e impossível de concretizar que é a música do mundo. Ainda outros ousam em quebrar para lá das barreiras da conotação experimental. Beheaded Totem, novo álbum dos HHY & The Macumbas editado pela House of Mythology, é um compacto vitamínico que praticamente sem se esforçar expande o conceito da música de dança experimental do século XXI. A verdade, é que os rótulos existentes não chegam para enquadrar este trabalho no panorama da arte sonora contemporânea. 

Enquanto que muitos dos trabalhos que têm saído dentro do mundo do jazz de fusão ou de forma livre são edificados nos moldes que já tinham sido construídos, o grupo liderado por Jonathan Uliel Saldanha – discutivelmente um dos artistas portugueses mais interessantes da atualidade – desconstrói o jazz, a música electrónica, a “world music” e a música de dança e a partir destes destroços edifica um ritual único e estranhamente dissociado das suas origens. Beheaded Totem existe não só enquanto álbum, mas também como um exercício de arte pós-moderna bem sucedido.

As secções de sopro são quase nobres e sacrilégios em simultâneo. Os ritmos de dança latinos e africanos preenchem o espaço que rodeia a improvisação e condução de Jonathan Uliel Saldanha graças aos quatro percussionistas que integram a banda. Nos intervalos desta sonoridade e graças ao mesmo quarteto, faixas como “Deep Sleep Routine”, “Ergot Glitter” e “Swisid Mekanize Rejiman” reformulam a música electrónica de club numa versão electro-acústica pós-tribal. 

Talvez o melhor ponto de equivalência para este álbum será um intermédio entre o seminal Bitches Brew de Miles Davis, um álbum que ficou conhecido pela maneira como revolucionou o jazz ao integrar ritmos repetitivos facilmente associados a processos ritualísticos e instrumentos eléctricos neste cenário, e os ritmos electrónicos de editoras como a Príncipe Discos. É óbvio que HHY & The Macumbas não é igual a Miles Davis, Chick Corea ou Dave Holland, tal como não é DJ Nigga Fox ou Niagara; é apenas o produto de séculos de música a convergirem num transe ritualístico de jazz de dança. É só, e apenas isso.

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