Rod Krieger em entrevista: “Sou da teoria que nunca se escutou tanta música quanto hoje em dia”

Rod Krieger em entrevista: “Sou da teoria que nunca se escutou tanta música quanto hoje em dia”

| Maio 2, 2020 8:30 pm

Rod Krieger em entrevista: “Sou da teoria que nunca se escutou tanta música quanto hoje em dia”

| Maio 2, 2020 8:30 pm
© Daryan Dornelles

Rod Krieger é um músico gaúcho que ao longo da sua carreira fez parte de conjuntos musicais como Os Efervescentes e Cachorro Grande, onde foi baixista por mais de 15 anos. O artista encontra-se a viver em Lisboa desde 2019 e foi na capital portuguesa que finalizou o seu primeiro disco a solo, A Elasticidade do Tempo, o qual começou a ser gravado no Brasil e apresenta sonoridades demarcadamente psicadélicas e expansivas. 


Em entrevista por e-mail, falámos com Rod Krieger sobre a sua colaboração com Arnaldo Baptista (ex-Mutantes), os seus antigos projetos, as novas influências na aventura a solo, a vida em Lisboa, a abertura do seu estudo Magic Beans, entre muitos outros assuntos.  Fiquem com a entrevista completa em baixo.




Uma coisa que reparámos quando escutámos A Elasticidade do Tempo foi que o disco abre com “Louvado Seja Deus” e fecha com “Vai com Deus”, duas músicas que falam sobre Deus. Houve alguma intenção da tua parte e se sim, qual a razão?


Rod Krieger (RD) – Não tinha notado isso até mandar o disco para masterizar, e o mais engraçado é que não partiu de mim, afinal, na abertura do álbum a fala, que deu nome à música, é do Arnaldo Baptista e a última canção é de autoria do Tony Bizarro. Fico muito feliz, pois acabo me sentindo abençoado.

O primeiro single deste disco de estreia surgiu em abril 2018, “Louvado Seja Deus”, com a participação de um dos teus ídolos, Arnaldo Baptista. O single seguinte “Todos Gostamos de Você” saiu quase ano e meio depois. Porquê este intervalo tão grande entre singles?

RD – Quando lancei “Louvado Seja Deus”, a ideia era ser o baixista da banda Cachorro Grande, que lançava singles esporádicos, mas com a ruptura do grupo eu senti a necessidade de lançar um álbum, e esse hiato foi o tempo que levou o processo de finalização e gravação das faixas, além disso, eu tinha fechado o lançamento com um selo português, que depois cancelou a parceria e acabou atrasando todo o cronograma. A ideia inicial era ter lançado o disco logo que cheguei aqui, em 2019. Mas como o tempo é elástico tudo aconteceu da maneira que tinha que acontecer e fico feliz por isso.



Trocaste muitas cartas com o Arnaldo Baptista e até podes chamá-lo de amigo. Como foi a experiência de trabalhar com este artista icónico? Vês-te a trabalhar novamente com ele?

RD – Foi um sonho realizado ter contato com o culpado por eu ter escolhido o caminho artístico. As coisas foram se encaminhando e o universo conspirou para a gente se conhecer. Primeiro o lance do álbum, depois, ele me convidou para fazer um show de homenagem aos discos dele em São Paulo, onde ficamos juntos uma semana e, talvez, foi um dos tempos mais incríveis da minha vida, aprendi muitas coisas com ele. E, sim, com certeza iremos fazer mais coisas juntos, direta ou indiretamente, assim que a pandemia acabar, inclusive, quero trazer o show de homenagem aqui para Europa, e, de preferência, com alguns convidados portugueses.

Foste baixista dos Cachorro Grande durante 15 anos, onde a composição era divida por cinco elementos. Como é que funciona o teu processo de composição agora que te apresentas a solo?

RD – As composições não eram bem divididas entre os cinco integrantes, pois ficavam focadas no vocalista e no guitarrista da banda. Devido a isso, acumulei muitos rascunhos e canções que foram usadas no disco A Elasticidade do Tempo. Sempre tive muita facilidade em escrever, antes mesmo de ser baixista da Cachorro Grande era líder de um power trio chamado Os Efervescentes no qual já compunha todas as músicas. Não existe uma regra para o meu processo de composição, as músicas vêm do nada e eu só tenho o trabalho de transcrevê-las como se fosse uma psicografia.

Neste disco é bem notória a influência da música indiana, principalmente devido à sonoridade da sitar gravada por Fábio Kidesh, que foi também teu professor. De onde surgiu essa vontade de aprender sitar e porquê a sua inclusão em A Elasticidade do Tempo?

RD – Sempre tive vontade de aprender esse instrumento, as bandas dos anos sessenta que incluíram o sitar nas composições me agradam muito. Já fazia tempo que eu queria estudar o instrumento, e o Kidesh caiu de paraquedas na minha vida, logo que consegui adquirir o instrumento comecei a estudar com ele o que acabou se transformando em uma amizade, aí o convite para o álbum acabou virando uma consequência.


A Elasticidade do Tempo é um disco que retrata o autoconhecimento e espiritualidade. De certa maneira pode ser visto como um disco de meditação. Podes-nos aconselhar alguns discos que consideres ideais para a prática de meditação?

RD – Vou ter dizer um único álbum, que foi um dos que mais me influenciaram. Radha Krsna Temple produzido pelo George Harrison. Posso dizer que esse foi o tempero secreto.




Depois de viveres 13 anos no caos de São Paulo e mais 2 anos na tranquilidade de Guarujá, o que te levou a mudares para Portugal?

RD – O resultado das eleições presidenciais foram cruciais, e também o fato de que eu não estava a fim de repetir tudo de novo, sempre tive vontade de tocar fora do Brasil e com a minha antiga banda era impossível. Então, a Europa acabou me puxando, e o fato de eu ter amigos que já residem aqui ajudou, junto com a facilidade de expandir o meu trabalho já que o meu disco foi gravado em português.

Que músicos portugueses conheceste e gostarias de destacar neste último ano em que viveste em Lisboa?

RD – Enquanto estou te escrevendo eu estou escutando o maravilhoso Bruno Pernadas, estou apaixonado pelo trabalho dele. Além dele, gosto muito dos rockeiros da Solar Corona, e dos Paus.

Que sítios da natureza te inspiram na cidade de Lisboa?

RD – É uma cidade portuária como a minha terra natal Porto Alegre. E o rio sempre foi inspirador, uma das coisas que eu mais gosto de fazer é caminhar pela manhã olhando para a água, é o meu momento de reflexão e meditação diária. Gosto muito das praias, mas, infelizmente, ainda não viajei o suficiente pelo resto do país, pretendo conhecer as pequenas cidades, me disseram que são encantadoras.

Estavas para abrir um novo estúdio em Lisboa, o Magic Beans, um espaço para ensaios de bandas, aulas de música, pré-produção e projetos de curadoria, mas a situação pandémica de Covid-19 estragou-te, para já, os planos. Quando isto acalmar, sempre vais avançar com esta ideia?

RD – Sim, os planos estão de pé, inclusive, assim, que essa epidemia passar eu vou fazer uma festa de arromba por lá para recuperar o tempo perdido. Hoje estou dando aulas via Skype e produzindo o disco de estreia de um artista aqui de Portugal, com previsão de lançamento para o final do ano.

Tens alguma estória caricata para nos contar dos tempos em que estavas nos Cachorro Grande e dividiste palcos com bandas como os Oasis, Supergrass, Primal Scream, Iggy Pop, Aerosmith e Rolling Stones?

RD – Infelizmente, as melhores eu não posso contar publicamente, mas posso te afirmar que a visita que os Rolling Stones fizeram no nosso camarim foi incrível, consegui beijar as mãos do Keith Richards, além de dar boas risadas com o Ronnie Wood e o Mick Jagger.

Achas que no contexto atual em que nos encontramos, que o tempo se tornou mais elástico, que temos mais tempo para ouvir discos?

RD – Eu sou da teoria que nunca se escutou tanta música quanto hoje em dia, se pararmos para pensar e observar todas as pessoas tem uma discografia no celular e andam para cima e para baixo com um fone de ouvido. Em relação ao tempo que vivemos (quarentena), acho que as pessoas podiam se afastar um pouquinho do telemóvel e prestar mais a atenção nos álbuns, ao invés de deixar a música sendo apenas trilha sonora de sua vida. Penso que as pessoas perderam um pouco o costume de apenas escutar o disco e analisar letras e encartes do álbum.

A Elasticidade do Tempo chegou às plataformas digitais a 20 de março e pode ser escutado na íntegra em baixo.

Rod Krieger une-se ao Cozinheiros do Bem – Food Fighters para ação de solidariedade

Por meio da plataforma Bandcamp, todas as vendas do disco de estreia de Rod Krieger, A Elasticidade do Tempo, terão 50% do rendimento revertido para o grupo Cozinheiros do Bem – Food Fighters. A proposta tem início desde já e, para marcar essa união da música com a iniciativa social, Krieger fará uma live no dia 9 de Maio, a partir das 20h30 em Portugal, onde Krieger vive em Lisboa, e 16h30 no Brasil, via Instagram e Facebook.  

“Pode parecer uma ação pequena, mas é o que eu consigo fazer agora. Todos, inclusive, acredito, devem fazer um pouquinho, o que eles puderem fazer já vale. A revolução vem do micro, não do macro, como esse sistema capitalista sujo impôs. Lamento, quer que eu faça o quê? Isso, não sou o Messias e não faço milagres, mas sinto orgulho de poder usar a minha arte para colaborar um pouco com o bem estar das pessoas. Conheço o Júlio Ritta há 25 anos, admiro muito o trabalho que ele realiza e, por isso, escolhi colaborar com o Cozinheiros do Bem”, diz Rod.

Ao adquirir o álbum será possível fazer o download das faixas em vários formatos (.wav, .mp3, .flac, etc) e também o download em alta resolução das capas de todas as canções, bem como a do disco, criadas pela artista visual e fotógrafa Marina Abadjieff. O valor é de €5, mas, durante todo o dia 09 de Maio, este estará em aberto para que as pessoas possam pagar quanto for possível. Quem não tiver Paypal, plataforma de pagamento pelo Bandcamp, e quiser fazer uma transferência bancária, envie um email para contato@cafe8.com.br para ter acesso às contas do Brasil ou Portugal.


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