The Microphones in 2022, Viseu

The Microphones in 2022, Viseu

| Março 23, 2022 1:50 pm

The Microphones in 2022, Viseu

| Março 23, 2022 1:50 pm

Era domingo, dia 13 de março de 2022. A bilheteira do Teatro Viriato, em Viseu, abriu às 17h00. Era dia de espetáculo: The Microphones, um dos projetos do conceituado músico estadunidense Phil Elverum, iria subir ao palco pelas 19h00. O artista não tocava em Portugal desde 2011, altura em que se apresentou em Lisboa e no Porto como Mount Eerie com o disco Wind’s Poem.

Enquanto a hora do concerto não chegava, os espectadores podiam visitar a exposição Sound of Sounds, dedicada ao trabalho do compositor alemão Hans Otte, com curadoria de Joana Gama e do alemão Ingo Ahmels. Estavam expostas partituras e desenhos de Otte, acompanhados de instalações sonoras que transmitiam duas das suas obras: Ich-Atemobjekt (1970) e Namenklang (1995). A exposição continuará presente no teatro até dia 8 de abril.

Todavia, o centro das atenções era claramente The Microphones. Phil Elverum reformou o projeto em 2002 para prosseguir a sua carreira enquanto Mount Eerie, no entanto, o multi-instrumentalista retirou-o da sua gaveta mais poeirenta para lançar  The Microphones in 2020. O disco, constituído por uma só faixa de quase 45 minutos, trata-se de uma profunda e vagarosa reflexão de Elverum acerca de The Microphones e da sua vida em geral, maioritariamente ao longo dos anos 90 e inícios de século XXI. No concerto que aconteceria poucas horas depois, esperava-se que Elverum apresentasse esse mesmo álbum ao público.

Já perto da hora de início, a sala de espetáculos do Teatro Viriato foi-se avolumando, apesar de não ter ficado lotada. Passados uns minutos,  as luzes apagaram-se, ficando apenas o palco iluminado. Pouco tempo depois Phil Elverum e o seu acompanhante de tour – Jay Blackinton, guitarrista e chef de cozinha premiado – entraram em palco. Antes da música per se, o protagonista deste fim de tarde dirigiu-se ao público, em inglês: “Obrigado por virem. Eu até aprenderia algumas saudações em português, mas vou atirar com tanto palavreado inglês nas vossas caras ininterruptamente”, declarou, seguido de um “obrigado” em português.

Quando Elverum começou a tocar na sua guitarra acústica, o que se suspeitava tornou-se real: The Microphones in 2020 seria o foco da noite. Assim, o duo Elverum-Blackinton, que representava The Microphones naquele momento, tocaram durante 45 minutos sem interrupções. Elverum cantava de cor a letra, desabafando o que o seu “eu” de há dois anos tinha para dizer ao mundo. A sua infância, os inícios de The Microphones com gravações de cassete amadoras, que o próprio descreve em tom cantado como “as primeiras tentativas embaraçosas”, a vida nas cidades de Anacortes e Olympia – no estado de Washington – e o fim de The Microphones: “At the very end of 2002, I took the Microphones name and crumpled it up and burned it in a cave on the frozen edge of Northern Norway. I made a boundary between two eras of my life”. 

No entanto, como sabemos, The Microphones voltaram após um interregno de 18 anos. Para Elverum isto não é uma reunião: “It makes me glad that I am only this contrary grump, impossible to reunite”. No fundo, The Microphones in 2020 é um epílogo deste projeto, e Elverum faz questão de o anunciar além estúdio, acompanhando estas palavras com um instrumental indie-avant-folk. Com receio de manter tudo isto como uma cópia exata do que foi transmitido em estúdio, em que a maior parte do tempo é dominado pela sonoridade de duas guitarras acústicas, o duo apostou numa amplificação das partes instrumentais mais impactantes do álbum. A certa altura do concerto, Blackinton substituiu a sua guitarra acústica por uma guitarra elétrica (tal como no álbum, mas com maior protagonismo). Pouco depois, Elverum pousou também a sua guitarra, substituíndo-a por um baixo. Depois de um sorriso de orelha a orelha, o artista estadunidense tocou um baixo extremamente distorcido e alto, que fez toda a sala ecoar. Foi possível testemunhar uma explosão ainda maior que em estúdio, intensificando as ocasionais migalhas drone que pontuam o trabalho, fazendo lembrar um pouco o black metal atmosférico presente em Wind’s Poem. Durante esta titânica distorção, Blackinton tocou a sua guitarra elétrica freneticamente, batendo com o pescoço do instrumento no chão sucessivamente, isto enquanto técnica sonora e não por pura estética punk ou grunge. Passados alguns minutos de caos, voltámos ao lado acústico, exatamente de onde tudo se deixou ficar.

Após cerca de 45 minutos, a canção termina, e com isso, o espetáculo. Elverum e Blackinton lançaram uns obrigados a uma plateia que aplaudia de pé e abandonaram o palco. Pouco depois, ambos estiveram à porta do teatro, a conversar com fãs, a assinar discos de The Microphones e Mount Eerie, cadernos e ainda uma insólita cópia de FIFA 2004 para o computador.

E assim aconteceu o único concerto de The Microphones em Portugal nesta tour norte-americana (que, para todos os efeitos, é o nome designado para a tour que passou pelos Estados Unidos, Canadá, Portugal e Espanha). Nos dois dias seguintes, Elverum e companhia iriam atravessar a fronteira para tocar em Ourense e Barcelona. Já Viseu irá receber Julie Doiron (que já colaborou com Mount Eerie) a 30 de março na Casa d’Artes e Ofícios (CAOS) e Grouper, no Teatro Viriato, a 30 de abril.

Fotografias de Carlos Fernandes

 

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